domingo, 15 de abril de 2007

Monarquia e monarquistas (2)


Monarquia e monarquistas (2)

O Plebiscito de 1993

A campanha televisiva do Movimento Parlamentarista Monárquico ficou a cargo da agência de publicidade do jornalista Helio Bloch. O MPM era chefiado pelo deputado Cunha Bueno, em Brasília, e pelo economista Gastão Reis Rodrigues Pereira, no Rio de Janeiro. Ele se chocava com os princípios legitimistas dos líderes monarquistas conservadores que lhes haviam ajudado no recolhimento das assinaturas em 1987. Com jingles e slogans populares — Vote no Rei!, Vamos coroar a Democracia! —, a campanha caiu na boca do povo e ganhou a adesão de milhares de brasileiros pobres.

O MPM formulava que o “trono brasileiro pertence à Nação e, portanto, somente o parlamento (Congresso Nacional) poderia homologar o nome do primeiro chefe de Estado da reinstauração monárquica”. Tacitamente, contudo, o deputado Cunha Bueno e seus aliados apoiavam os chamados “príncipes de Petrópolis”.

Entre os líderes conservadores da velha Corte, despontava a figura do professor de História da SUAM e da Universidade Católica de Petrópolis, Otto de Alencar de Sá Pereira, antigo assessor-chefe de D. Pedro Henrique. Otto e os súditos fiéis de D. Luiz reuniam-se no Círculo Monárquico do Rio de Janeiro. Em São Paulo, os fiéis a D. Luiz e D. Bertrand se aglutinavam na Pró-Monarquia, entidade ainda existente (www.monarquia.org.br). Nos demais estados, havia os círculos monárquicos legitimistas ou as representações regionais do MPM.

Foi o período que, inegavelmente, viu os monarquistas brasileiros numa militância ousada. Mesmo com suas idiossincrasias, aliadas à divisão existente entre os príncipes brasileiros, o parlamentarismo monárquico conseguiu obter quase 7 milhões de votos — equivalente a 13% dos votos válidos.

Segundo o historiador Ricardo Salles expõe em Nostalgia Imperial: “O fato é que, um século após sua proclamação, a República ainda não se considerava suficientemente legitimada. Apesar do aparente caráter anacrônico do plebiscito, da previsível vitória de uma solução republicana, da relativa indiferença popular e de um certo tom cômico que recobriu o episódio, não podemos subestimar seu valor simbólico. Nos debates que marcaram os acontecimentos, sempre esteve em pauta alguma referência ao regime monárquico do XIX. Suas virtudes ou mazelas comparadas com o século republicano foram ressaltadas e combatidas pelos dois lados (...)”

Quem seriam os nostálgicos do Império que teriam votado a favor da Monarquia no Plebiscito? Sabidamente apoiaram o MPM, nos anos de 1992 e 1993, inúmeros profissionais das ciências sociais: os antropólogos Roberto Damatta, Otávio Velho e Luís Fernando Duarte, por exemplo. O sociólogo Rubem César Fernandes, fundador da famosa ONG Viva Rio, aderiu à Monarquia. O jurista católico Célio Borja ou o economista Mário Henrique Simonsen, ex-ministros da Justiça e da Fazenda da República, também “votaram no rei”...

O publicitário Jorge Maranhão, gestor da OSCIP A Voz do Cidadão, que implementa oficinas de estudo da Cidadania em empresas públicas e privadas, é outro exemplo: “Votei na Monarquia e votaria de novo, se surgisse oportunidade”.


A realeza brasileira

Ano que vem o Brasil celebrará os 200 anos da chegada dos Bragança ao país. Se a monarquia ainda existisse, seus sucessores, os Orleans-e-Bragança, seriam reinantes e um deles seria o atual imperador.

Semanas antes do plebiscito, o jornalista Renato Machado, no programa Fantástico (TV Globo), fez a seguinte narrativa: “Poucas pessoas conhecem, de fato, a história da monarquia brasileira. A última a usar a coroa foi a Princesa Isabel e foi ela mesma quem causou a ‘confusão’. A Princesa teve três filhos: D. Pedro, D. Luiz e D. Antonio. O mais velho seria o sucessor natural, mas ele renunciou para se casar com a condessa de Dobrzensky, de família nobre, mas não real.”

Com essas poucas palavras, Machado foi ao cerne daquilo que divide tanto a família Orleans-e-Bragança quanto os monarquistas brasileiros. Essa renúncia, ocorrida em 1908, em Cannes (França), deu-se após longos anos de reflexão de D. Pedro de Alcantara (1875-1940), o neto de D. Pedro II que fora príncipe do Grão-Pará do nascimento até o dia em que o avô morreu em Paris e ele tornou-se, pela tradição dinástica, o príncipe imperial, herdeiro imediato da imperatriz de jure, D. Isabel I. A maioria imagina que a pressão exercida por D. Isabel junto ao seu primogênito era ocasionada exclusivamente pelo noivado com a baronesa Elisabeth Dobrzenska de Dobrzenicz — cujo pai fora elevado a conde titular e par do reino da Bohêmia por Franz Joseph I —, mas não era. Os sogros gostavam muito de Elsie, como era chamada a futura D. Elisabeth de Orleans-e-Bragança, e o Conde d´Eu a tinha como prima distante.

Há vários outros motivos que levaram D. Pedro de Alcantara a renunciar em 1908. Seja como for, esta renúncia teve caráter irrevogável e foi extensiva aos descendentes eventuais da união. Foram eles os príncipes de Orleans-e-Bragança D. Isabel (1911-2003), a futura Condessa de Paris; D. Pedro Gastão (1913); D. Maria Francisca (1914-1968), a futura Duquesa de Bragança; D. João (1916-2005) e D. Thereza (1919), que vive em Estoril, Portugal.

O filho único de D. João é o carismático príncipe D. João Henrique (1954) — mais conhecido como “D. Joãozinho” —, dono da Pousada do Príncipe em Paraty e o mais midiático membro da família.

Do casamento de D. Luiz com D. Maria Pia de Bourbon, princesa das Duas Sicílias, prima-sobrinha da Redentora, nasceram D. Pedro Henrique (1909-1981), D. Luiz Gastão (1911-1931) e D. Pia Maria (1914-2000), príncipes do Brasil e de Orleans-e-Bragança. O neto primogênito e herdeiro de D. Isabel foi batizado pomposamente, em 1909, no palacete de Boulogne-sur-Seine, e reconhecido como príncipe do Grão-Pará por todos os órgãos monarquistas existentes no Brasil. Havia também vários nobres brasileiros que compunham essa espécie de “Corte no exílio” que rodeava D. Isabel em Paris e no castelo de Eu, propriedade de D. Gastão (1842-1922), seu marido e mais conhecido justamente como Conde d´Eu, por causa do título com que o avô (Louis-Philippe I) o agraciara no dia do nascimento.

No final de 1920, após a morte de D. Luiz, a República brasileira assegurou-se de que não havia mais real perigo de restauracionismo e revogou o banimento da Família Imperial, convidando os príncipes a regressarem à Pátria e solicitando de D. Isabel permissão para a trasladação dos restos mortais de D. Pedro II e D. Teresa Cristina para o Rio de Janeiro. Os despojos foram trazidos por D. Gastão, D. Pedro de Alcantara, D. Elisabeth e filhos e D. Maria Pia (viúva) e filhos. Daí a dois anos, o Brasil festejaria o Centenário da Independência (1922).

Em 14 de novembro de 1921, D. Isabel faleceu. Somente restava vivo seu primogênito. O filho mais novo, D. Antonio (1881-1918), havia morrido sem sucessão, de uma queda de avião. Dinasticamente, a chefia da Casa Imperial passou ao neto D. Pedro Henrique, de 12 anos, ainda que a “governança” da família ficasse nas mãos de D. Pedro de Alcantara.

Na década de 1940, após a morte de D. Pedro de Alcantara, seu primogênito D. Pedro Gastão decidiu reverter a renúncia paterna e passou a se considerar herdeiro da coroa brasileira. Em 1946, a família foi aos tribunais, não por causa dos direitos ao trono, mas por causa das ações da Companhia Imobiliária de Petrópolis. Nessa causa perdida por D. Pedro Henrique, D. Pedro Gastão e os irmãos ficaram sendo os únicos proprietários da enfiteuse de Petrópolis, remanescente das terras da fazenda do Córrego Seco, comprada por D. Pedro I na década de 1820.

Em 1971, os primos todos se reuniram para trasladar do Rio de Janeiro à Catedral de Petrópolis os restos mortais da Redentora e do marido. Foi aí que surgiu, na imprensa, a expressão “ramos de Vassouras e de Petrópolis da família imperial”.

No mesmo ano (1981) em que seus filhos D. Eleonora e D. Antonio João se uniram a dois irmãos belgas, os príncipes Michel e Christine de Ligne, garantindo a continuidade da dinastia do Brasil, D. Pedro Henrique faleceu em Vassouras, legando a chefia da Casa Imperial a D. Luiz (1938), celibatário e membro da extinta TFP (Tradição, Família e Propriedade), associação de extrema-direita católica jamais apoiada pela CNBB.

D. Luiz e seu irmão-sucessor, D. Bertrand (1941), sempre foram considerados politicamente inviáveis, justamente pela afiliação à TFP, mas nunca renunciaram. Vivem em São Paulo, onde administram a Pró-Monarquia e visitam o Rio anualmente para celebrar, no Outeiro da Glória, o aniversário de D. Luiz todos os 6 de junho.

A maior parte dos monarquistas brasileiros deposita em D. Pedro Luiz (1983), primogênito de D. Antonio João, todas as esperanças e aspirações. O jovem príncipe, graduado em Administração pelo IBMEC do Rio de Janeiro, vive atualmente no Grão-Ducado de Luxemburgo, onde trabalha no sistema financeiro.

D. Pedro Luiz, um Orleans-Bragança-Wittelsbach-Ligne-Bourbon-Nassau-Weilburg, três vezes descendente direto de D. João VI e três vezes descendente colateral de Maurício de Nassau, poderá ser um D. João IV — o Restaurador — para o Brasil do século XXI, transformando assim em realidade política e social o sebastianismo dos monarquistas.

Sobre ele falam com brilho nos olhos os pais, a avó D. Maria da Baviera (viúva de D. Pedro Henrique), tios e primos. Oxalá tenham todos a sorte de que o príncipe corresponda a tantas expectativas...

Publicado, com edições, na Revista BR HISTÓRIA (abril de 2007).

Monarquia e monarquistas (1)


Monarquia e monarquistas (1)

BRUNO DE CERQUEIRA

Sob este título, precisamente, o jurista Tito Franco d´Almeida (1829-1899) publicava, em 1895, em Belém do Pará, seu livro de memórias sobre os anos traumáticos pós-1889, onde ele e alguns antigos chefes políticos paraenses se reuniam tentando manter viva a chama de fidelidade ao Império do Brasil e à Dinastia exilada.

Tito Franco era conselheiro do Império e havia sido eleito deputado geral para a última Câmara; estava viajando ao Rio de Janeiro quando soube, no meio do caminho, do golpe de 15 de novembro e suas conseqüências. Liberal acirrado e constitucionalista radical, foi um crítico contumaz do chamado poder pessoal de D. Pedro II, todas as vezes que o imperador beneficiou os Conservadores no Ministério, durante os anos 1860 e 1870. Na década de 1880, Tito Franco atuou como um prócere da monarquia brasileira que, segundo ele, era a única forma de organização social capaz de dar ao Brasil a “democracia — religião política em que sempre tenho comungado —, democracia coroada que temos no Império pela Constituição, democracia cristã, ilustrada, laboriosa, onde cada indivíduo aprende a governar-se desde a infância”.

Assim como os anos finais da vida de Joaquim Nabuco, Eduardo Prado, Affonso Celso, Rodolpho Dantas ou Carlos de Laet foram de intensa atividade publicista, os de Tito Franco também foram; nunca mais, porém, de atividade legislativa ou governativa. A vida e a obra desses senhores são, para a maioria dos brasileiros atuais — e até dos historiadores — uma grande incógnita. Por quê? Porque eram monarquistas...

Paulo Napoleão Nogueira da Silva, ex-professor de Direito Constitucional da PUC-SP, teoriza que os brasileiros têm sido submetidos, desde novembro de 1889, ao condicionamento ideológico republicano, segundo o qual a vinda da Corte (1808) foi uma fuga covarde das tropas napoleônicas; o reinado de D. João VI foi caricato, devido a sua figura de bonachão; a Independência do Brasil é mais caudatária do heroísmo do Tiradentes do que do de D. Pedro I; o reinado de D. Pedro II, apesar de tão extenso, não configurou exceção à história de atraso do desenvolvimento econômico, político e social do Brasil, sendo a imagem recorrente do imperador demonstrada pelos livros didáticos prova cabal da “decrepitude” da monarquia brasileira: um velhinho de barbas brancas, algo senil.

Sobre a filha e sucessora de D. Pedro II, D. Isabel (1846-1921) — conhecida quase exclusivamente pela expressão Princesa Isabel —, que durante trinta anos foi a soberana exilada do Brasil na França (1891-1921), a mulher paradoxalmente mais famosa e mais desconhecida da História nacional, proferem-se os maiores despautérios.

Neste “império da ignorância”, reina a falta de conhecimento sobre a melindrosa história da República Velha e seus quarenta anos de militarismo, guerras contra civis, autoritarismo, coronelismo, corrupção governamental. Rui Barbosa, um dos mentores intelectuais do regime estabelecido em 1889 e o maior postulante de sua legitimação jurídica, assim descreve o Brasil em discurso aos membros do Senado, em 1914: "Hoje, senhores, a moral do homem público vai sendo aquela do deputado que, estranhando um amigo vê-lo sustentar o Governo Hermes [da Fonseca], com rara felicidade lhe respondeu: ‘Não sou eu quem sustenta o Governo, ele é que me sustenta’. Não se poderia definir com mais espírito, nem com mais cinismo, a verdade absolutamente verídica da nossa época e do nosso regime”.

Em outra ocasião, ainda em 1914, ele discorre sobre a inação da Justiça num trecho extremamente famoso, quase nunca citado de forma integral: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto... Essa foi a obra da República nos últimos anos. No outro regime [a Monarquia] o homem que tinha certa nódoa em sua vida era um homem perdido para todo o sempre — as carreiras políticas lhe estavam fechadas. Na República, os tarados são os tarudos. Na República, todos os grupos se alhearam do movimento dos partidos, da ação dos Governos, da prática das instituições. (...) a mais grave de todas as ruínas é a falta de penalidade aos criminosos confessos, é a falta de punição quando se aponta um crime que envolve um nome poderoso (...) que todos conhecem, mas que ninguém tem coragem de apontá-lo à opinião pública”.

Os monarquistas brasileiros foram postos na ilegalidade durante 99 anos. Ridiculamente, o mesmo decreto do Marechal Deodoro (85a – 23.12.1889) que estabelecia a previsão de referendum para aquiescência dos brasileiros à República, estabelecia “uma comissão militar para julgamento dos crimes de conspiração contra a República e seu Governo, aplicando-lhes as penas militares de sedição”. Desde a primeira cláusula pétrea anti-monarquista na Constituição de 1891, todas as constituintes do século XX inseriram algum artigo que impedisse a organização de qualquer movimento político contrário à forma de governo vigente.

Em 1987, o deputado federal paulista Antonio Henrique da Cunha Bueno conseguiu inserir uma emenda popular na Constituinte, baseado em um milhão de assinaturas — obtidas em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pará, Pernambuco e vários outros estados — que previa a realização do almejado referendo sobre forma e sistema de governo no Brasil. A Constituição de 1988 tem, nas disposições transitórias, o conclame a esse plebiscito em 7 de setembro de 1993. Manobras políticas de deputados temerosos das simpatias monarquistas conseguiram alterar a data, antecipando-a para 21 de abril, por motivos óbvios...

Em 1992, institutos de pesquisa começaram a demonstrar que a campanha pró-monarquia estava gozando de 22% das intenções de votos e isso apavorou alguns políticos de Brasília, mormente os que compuseram a Frente Presidencialista (PFL / PT / PMDB / PTB) e a Frente Parlamentarista Republicana (PSDB). A campanha do Plebiscito, do ponto de vista do marketing político, naqueles anos terríveis de fins da era Collor, foi um show de incongruências. Os republicanos distorciam a história e diziam que a volta da monarquia significaria a volta da escravidão. Os monarquistas, por sua vez, apesar de argumentos sólidos sobre a estabilidade política de que gozam os dinamarqueses, noruegueses, suecos, japoneses, australianos, canadenses, britânicos, belgas, holandeses etc., não conseguiam fazer entender à população por que seríamos melhores se restaurássemos o trono. Aliás, sobre o aspecto da sucessão ao trono, as divisões entre os monarquistas eram tantas e tamanhas que surgiam mil candidatos a “rei”, não somente entre os Orleans-e-Bragança...

Passado o plebiscito, os monarquistas, extremamente divididos, voltaram a se reunir em pequenos grupos, de atuação limitada. Em 1995, dissidentes da Pró-Monarquia fundaram o Brasil Imperial (www.brasilimperial.org.br), movimento que congrega todos os desgostosos com o reacionarismo de D. Luiz e D. Bertrand, mesmo que em sua maioria sejam favoráveis aos direitos dinásticos de ambos. O movimento é chefiado pelo empresário paulista Alan Assumpção Morgan e pelo general da reserva Pedro de Araújo Braga e edita, mensalmente, a Gazeta Imperial, órgão democrático de exposição do pensamento de monarquistas do Brasil inteiro.

Vários encontros monarquistas foram realizados nos anos 1990 e 2000, tanto em São Paulo e Rio, quanto em outras capitais. A tônica é sempre a de que a instabilidade política da República conduzirá os brasileiros a desejarem a restauração do Império. Por ironia da história, os monarquistas brasileiros assistiram, alhures, no mesmo ano de 1993, primeiro em setembro, depois em novembro, a dois importantíssimos processos políticos de restauração e estabilização social: no Camboja, em setembro, a constituinte finalmente recolocou no trono o idoso rei Norodom Sihanouk, após décadas de exílio e em Uganda, o presidente Yoweri Museveni restabeleceu constitucionalmente os quatro reinos tribais do país (Buganda, Toro, Bunyoro-Kitara e Busoga), após décadas de ditadura militar e guerrilhas civis.

É sabido também que a restauração da Monarquia espanhola em 1975, após a morte do caudilho Francisco Franco, conduziu o país a uma consolidação democrática e a um boom de desenvolvimento social e econômico sem precedentes. Esse é um dos argumentos mais utilizados pelos monarquistas brasileiros. Afinal, a separação entre chefia de Estado e chefia de Governo e a sucessão hereditária da primeira são os pontos ultra-positivos das monarquias modernas. Gastão Reis, atual presidente da FIRJAN da Região Serrana, em recente artigo no Jornal do Brasil sobre o filme A Rainha, de Stephen Frears, comenta: “o soberano é o chefe de Estado por excelência, ou seja, representa a Nação, personifica o interesse público e exerce aquela posição sem dever favores a grupos econômicos ou a partido político que o teria eleito, como ocorreria, por exemplo, num regime parlamentarista republicano.”

Contudo, até os dias de hoje, os monarquistas brasileiros nunca conseguiram apresentar-se como uma alternativa viável dentro dos complexos quadros da política nacional. Parece que a maioria é contrária à criação de um partido monarquista, por se manter leal ao princípio soberanista. Não há um projeto constitucional desenvolvido e eles não possuem representação parlamentar.

José Murilo de Carvalho, autor de dezenas de livros sobre o Império e que está lançando agora a mais recente biografia de D. Pedro II, não suporta a “pecha” de monarquista. Procurado especificamente por causa desta matéria ele foi taxativo: “Não sou monarquista.”. Como historiador e cientista político, ele prefere a qualificação de monarcólogo.

O professor da Universidade Federal de São Carlos (SP), Marco Antonio Villa, autor da mais importante contribuição historiográfica sobre a Guerra de Canudos nos últimos anos, considera ponto pacífico que a República Velha constituiu um período de regresso na História do Brasil, quando comparado ao II Reinado. Todavia, ele não enxerga a menor possibilidade de a restauração voltar a ser cogitada seriamente nos debates políticos nacionais. “Sou um republicano convicto, no sentido de acreditar na defesa da coisa pública acima de tudo; aliás, exatamente como foi D. Pedro II”...

Para fomentar os estudos sobre as décadas de 1880 a 1930, historiadores, advogados, jornalistas e outras dezenas de cultores do abolicionismo e da chamada “redenção do Brasil” fundaram, em 13 de maio de 2001, o Instituto Cultural D. Isabel I a Redentora (www.idisabel.org.br) — o IDII —, na igreja da Imperial Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos do Rio de Janeiro. O instituto propugna o neo-abolicionismo, resgate histórico e retomada do maior movimento social brasileiro do Oitocentos. Concentrando monarquistas ou republicanos, o IDII se importa muito mais com a questão educacional do Brasil do que com disputas entre príncipes e/ou seus partidários. Para os neoabolicionistas, o lema de André Rebouças é o leitmotiv: “Abolir a escravidão não bastou; é necessário abolir a miséria”.

O IDII é apoiado por diversos historiadores, entre os quais o professor da UERJ e da UNIRIO Ricardo Salles que, republicano e gramsciano, já declarou várias vezes: “Apóio o neoabolicionismo e louvo enormemente as iniciativas do IDII”. Da mesma forma, Maria Alice Rezende de Carvalho, professora do IUPERJ e autora de uma esplêndida biografia de André Rebouças. Para ela, resgatar Rebouças, Nabuco, Taunay e vários outros é ajudar a construir o Brasil que eles idealizaram.