segunda-feira, 7 de setembro de 2009

O casamento de D. Isabel, Princesa de Orleans-e-Bragança


Nesta Semana da Pátria, quero honrar a memória de D. Pedro I (*1798 †1834) comentando sobre o casamento de uma sua pentaneta.

Em 16 de outubro de 2009, uma sexta-feira, à noite, casar-se-á na Igreja da Imperial Irmandade de Nossa Senhora da Glória do Outeiro — o famoso Outeiro da Glória dos guias turísticos do Rio de Janeiro — a Princesa D. Isabel Maria Eleonora de Orleans-e-Bragança, trineta de D. Isabel (*1846 †1921), conhecida como Redentora, por ter lutado pela Abolição da Escravatura no Brasil e assinado a Lei de número 3353, que redimiu a história brasileira de sua maior nódoa.

A noiva é a filha mais velha do Príncipe D. Fernando Diniz, que nasceu em Petrópolis em 1948 — mesmo que pertença ao que a imprensa chama de “Ramo de Vassouras” —, e da Princesa D. Maria da Graça, nascida e criada no bairro da Urca (Rio de Janeiro). D. Isabel tem duas irmãs, as belas D. Maria da Glória, 27 anos, arquiteta graduada pela Universidade Santa Úrsula, e D. Luiza Carolina, 25, que termina a graduação em Administração na PUC-Rio.

D. Isabel nasceu em 30 de janeiro de 1978, no Hospital São Lucas, Rio de Janeiro. Estudou em bons colégios da Zona Sul carioca e teve vida de classe média, como a maior parte de suas amigas de infância. Ela se graduou e pós-graduou em Psicologia na PUC-Rio e trabalhou na área de projetos sociais da White Martins. Ao contrário do que muitos imaginam, os príncipes brasileiros não são ricos, visto que a República nunca os ressarciu pelos inúmeros confiscos e perdas perpetrados desde 1889; atestar esse fato histórico-jurídico está longe de constituir monarquismo, uma vez que a União Europeia estipula como um dos pressupostos para a entrada de nações ex-comunistas a indenização de príncipes e nobres espoliados durante e após a II Guerra Mundial. Na descendência da Redentora, apenas o chamado “Ramo de Petrópolis” recebe o laudêmio enfitêutico de Petrópolis, e isso não perfaz grandes somas.

A noiva foi batizada com o prenome ISABEL por ser sobrinha e afilhada da Princesa D. Isabel do Brasil, filha de D. Pedro Henrique (*1909 †1981) — “de jure” D. Pedro III —, cujo centenário de nascimento está sendo comemorado. D. Pedro Henrique, aliás, nutria um carinho todo especial pela netinha que portava o nome de sua avó... Pois bem: D. Isabel do Brasil é prima-sobrinha e afilhada da Princesa D. Isabel de Orleans-e-Bragança (*1911 †2003), a famosa Condessa de Paris, autora consagrada no Brasil e na França, aquela que teria sido rainha-consorte francesa durante a maior parte do século XX, se a Revolução de 1848 não tivesse expulsado do milenar trono de Hughes Capet (c. 938 †996) os seus últimos herdeiros, a Casa de Orleans. Continuando a genealogia, a Condessa de Paris era neta e afilhada de D. Isabel a Redentora, que por sua vez era neta e afilhada da Rainha-mãe das Duas Sicílias, nascida Infanta D. Maria Isabel de Espanha (*1789 †1848).

ISABEL tem origem em um vocábulo feminino do hebraico arcaico, que designava “aquela que é consagrada a Deus”. Desse antigo nome (Elisheva) originam-se, provavelmente, o germânico Elisabeth, o inglês Elizabeth, o francês arcaico Isabeau e o atual Isabelle, os italianos Elisabetta e Isabella, o russo Yelizaveta, o húngaro Erzèbet, o eslavo Alsbietta etc. Todos eles prestam culto às santas da Igreja que, nascidas em linhagens principescas, viveram suas vidas na caridade: Isabel (séc. I a.C. †c. 20 d.C.), a prima de Maria cujo filho (João Batista) saudou Jesus ainda no ventre materno; Isabel da Hungria (*1207 †1231), a duquesa-consorte da Turíngia que foi a primeira penitente da Ordem Franciscana a ser canonizada e Isabel de Portugal (*1271 †1336), nascida infanta de Aragão e que foi a rainha-consorte de D. Diniz I (*1261 †1325). O curioso é que a noiva descende diretamente de Santa Isabel de Portugal, que era sobrinha-neta de Santa Isabel da Hungria, que era sobrinha de Santa Edwiges (*1174 †1243), a célebre padroeira dos endividados que nasceu na atual Baviera (Alemanha), como princesa de Andechs-Merânia e reinou como duquesa-consorte da Silésia (atual Polônia). Nas representações iconográficas, as três parentes são mostradas com coroas exatamente por isso.

Outra coincidência — ou teocidência? — que chama atenção é a de que a data escolhida pelos noivos, aleatoriamente, tenha sido 16 de outubro (festa de Santa Edwiges no calendário litúrgico católico), exatamente um dia após os 145 anos de casamento da Redentora com o Conde d´Eu, celebrado em 15 de outubro de 1864.

Mas, e o noivo, quem é? Digno dos pomposos almanaques da realeza europeia, seu nome tira o fôlego: Alexander Heinrich Martin Christoph Antonius Franziskus Xaverius Benedictus Hubertus Maria. Filho de um conde principesco alemão e de uma nobre belga, Alexander de Stolberg-Stolberg nasceu em Frankfurt, em 1974, e tem dois irmãos e uma irmã. Economista de formação, trabalha no mercado financeiro em Bruxelas, onde conheceu D. Isabel. Anexada ao presente texto, está uma foto dos príncipes no Natal de 2008, na Bélgica.

Alexander é um primo distante do Conde d´Eu, o Príncipe Gaston de Bourbon-Orleans (1842-1922), que era trineto de uma Stolberg-Gedern — um dos muitos ramos em que se dividiu a Casa de Stolberg durante os séculos. Eles são uma dinastia da região norte da Renânia que foram mediatizados pelo Congresso de Viena (1815), passando à esfera dos monarcas prussianos (dinastia Hohenzollern). Muitos Stolberg foram ministros e administradores regionais na Baviera e na Prússia, além de militares e religiosos. Parte da linhagem é católica, parte é luterana, como costuma ocorrer entre os príncipes germânicos após a Reforma Protestante do século XVI.

Alexander descende colateralmente de um grande bispo católico do séc. XIX, D. Willhelm von Ketteler (1811-1877), um dos apoiadores do Papa Leão XIII na encíclica Rerum Novarum (1891), considerada documento “fundador” da Doutrina Social da Igreja. Ketteler foi citado, recentemente, pelo Papa Bento XVI na Deus Caritas est.

Os noivos são extremamente unidos na fé religiosa e a catolicidade parece que dará o tom de seu casamento, visto que vários primos de diferentes nacionalidades estarão na Cidade Maravilhosa para cumprimentá-los e homenageá-los.

Do nordeste brasileiro, vieram congratulações esfuziantes pelo noivado, que ocorreu em outubro de 2008, por parte dos amigos cearenses da Família Imperial brasileira. Explica-se. A mãe da noiva, D. Maria da Graça, é, pela família materna, da aristocracia do Ceará, sendo bisneta de José Candido de Souza Carvalho (*1863 †1941), vice-presidente do Estado do Ceará no governo (1920-23) de Justiniano de Serpa (*1852†1923), e descendente das famílias colonizadoras da ribeira do Acaraú (CE).

Apesar de a notícia do noivado ter sido divulgada entre os associados do Instituto Cultural D. Isabel I a Redentora, poucos no Brasil estão a par do acontecimento histórico que terá lugar no Rio de Janeiro, no próximo dia 16 de outubro. Trata-se da primeira trineta brasileira de D. Isabel — e justamente sua homônima — a se casar com um príncipe europeu. No Velho Continente, outros da quarta geração da linhagem isabelista já o fizeram: Marie da França (*1959), que desposou Gundakar de Liechtenstein; Mathilde de Wurtemberg (*1962), esposa do conde principesco hereditário de Waldburgo-Zeil-Trauchburgo; D. Maria Paloma de Bourbon (*1967), que se casou com Simeon da Áustria; Eudes da França (*1968), Duque de Angoulême, que desposou Marie-Liesse de Rohan-Chabot e, mais recentemente, D. Aimone de Savóia-Aosta (*1967), que se casou com Olga da Grécia e da Dinamarca, ela mesma também descendente de D. Pedro I...

O Rio de Janeiro, a antiga Corte imperial e capital da República, novamente sediará um evento dessa magnitude. A simplicidade e a religiosidade dos noivos pode — e deve — ser sempre digna de toda a admiração, mas é indiscutível que essa boda representaria uma oportunidade de ouro para o turismo histórico-cultural carioca se pudesse ser bem aproveitada. Após a Missa de Esponsais no Outeiro, cantada pelo coro do Maestro Julio Moretzsohn, os convidados — cerca de 300 pessoas, pelo limite necessário — partirão para o chamado “Paço Imperial”, ou seja, o Paço da Cidade, onde os imperadores despachavam e onde foi assinada a Lei Áurea. Lá ocorrerá a simpática festa de casamento com ornamentação de Antonio Neves da Rocha, contraparente da noiva.

Dias antes, o Instituto D. Isabel (IDII) pretende celebrar uma Missa votiva na Antiga Sé, local do casamento da Redentora, para festejar as Efemérides Brasileiras de 2009 e homenagear os nubentes, dando assim a oportunidade de que absolutamente qualquer um possa felicitar Sua Alteza Real a Senhora D. Isabel e Sua Alteza Ilustríssima o Senhor Alexander.

No presente ano, comemoramos:

·         200 anos do Corpo da Guarda de Polícia da Corte (atual PMERJ) – 13 de Maio
·         190 anos do nascimento de D. Maria da Glória (D. Maria II de Portugal) – 4 de Abril
·         185 anos da 1ª Constituição do Brasil – 25 de Março
·         185 anos da Imigração Germânica no Brasil
·         180 anos do casamento de D. Pedro I com D. Amelia de Leuchtenberg – 2 de Agosto em Munique e 17 de Outubro na Antiga Sé
·         145 anos do casamento de D. Isabel com D. Gastão (Conde d´Eu) – 15 de Outubro
·         120 anos da morte de D. Thereza Christina Maria – 28 de Dezembro
·         100 anos do nascimento de D. Pedro Henrique – 13 de Setembro

·         95º aniversário de D. Maria da Baviera – 09 de Setembro

Alguns sócios do Instituto idealizaram também um jantar beneficente na Casa Julieta de Serpa, no Flamengo, em prol do IDII e do Ballet de Santa Teresa (www.bst.org.br), uma ONG seriíssima do bucólico bairro de Santa Teresa, onde meninas de origem humilde se tornam exímias bailarinas. Como não surgiram patrocínios, o evento corre o risco de não se concretizar... Foi-se o tempo em que D. Pedro II (*1825 †1891) e sua Família eram os maiores mecenas do Brasil e as atividades artísticas e culturais constituíam uma das prioridades dos governantes.

De qualquer forma, o Rio de Janeiro pode se regozijar de assistir a mais um consórcio da realeza. Talvez a maioria das pessoas não saiba, mas o Carnaval carioca surgiu, em certa medida, no longínquo 1810, conforme expliquei em palestra do Bicentenário, ano passado, no Museu do Primeiro Reinado:

Cumpriu-se a vontade do Príncipe Regente e, a 13 de maio de 1810, quando completava 43 anos, ele casou sua filha e seu sobrinho na Capela Real do Rio de Janeiro, no primeiro enlace principesco europeu das Américas... Imaginemos o quanto não se engalanaram os cariocas, fluminenses e todos os demais colonos brasílicos para assistir às festividades. Interessantíssimo é que Oliveira Lima, baseado nos escritos do Padre Perereca (Pe. Luiz Gonçalves dos Santos) dedica as primeiras páginas de seu cap. 26 (As solenidades da Corte), a descrever o exotismo dos folguedos desse casamento.
Isso porque se tratava, precisamente, da primeira festa por assim dizer “mestiça”, ou mesclada/miscigenada, entre uma solenidade curial européia e uma folia colonial ibero-americana. Junção de touradas, cavalhadas, danças africanas e até de um drama, certamente italianizado, celebrado na véspera dos esponsais (Triunfo da América), o casamento de D. Maria Thereza e D. Pedro Carlos foi uma “festa de arromba”, como diríamos hoje em dia.

Vejamos a descrição de Oliveira Lima:

O cúmulo do burlesco atingiram, porém, as festas, comemorativas ainda da boda, celebradas meses depois, e que decerto procriaram o carnaval fluminense. Duraram sete dias na praça do Campo de Sant´Anna e, para amostra do que foi o desfilar de carros alegóricos, basta referir que o primeiro, o dos mercadores, figurava um monte coroado pela estátua da América de arco, aljava, cocar,  e saiote de plumas, cercada de índios, quadrúpedes, e pássaros assomando dentre as ervas e flores, donde também brotavam esguichos que aguavam a praça. Havia nos outros carros, oferecidos pelos ourives, negociantes de molhados, latoeiros, carpinteiros, e outros como os denominaríamos hoje sindicatos profissionais, uma dança de chins, uma ilha do Pacífico com seus indígenas, um castelo donde emergia uma dança militar, um escaler de marujos remando e cantando antes de desembarcarem e bailarem, um grupo de ciganos com as mulheres nas garupas dos cavalos, até uma dança de homens disfarçados em macacos, dando saltos, fazendo caretas, executando cabriolas, até formarem a pirâmide humana — nil nove sub sole — e o macaquinho do tope desenrolar diante da tribuna real... os retratos dos sereníssimos consortes.


Enfim, após a inestimável perda que representou a tragédia do AIR FRANCE, onde tantos compatriotas e estrangeiros pereceram e finou-se o primo-irmão da noiva e futuro herdeiro dos direitos ao trono, D. Pedro Luiz (*1983 †2009), que Deus conceda à Família Imperial, ao Brasil e ao Rio de Janeiro bênçãos especiais por ocasião de mais um enlace principesco.

Vivas ao Brasil e aos Brasileiros!

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Pedro Luiz de Orleans e Bragança, um homem de Deus


Quo res cumque cadunt semper stat linea recta.
Lema dos Príncipes de Ligne.


Conheci D. Pedro Luiz em junho de 1996, em coquetel na Câmara Municipal do Rio de Janeiro que encerrava o dia de homenagens pelo aniversário de seu tio, D. Luiz. Os natalícios do imperador de jure do Brasil são sempre comemorados com Missa Solene no Outeiro da Glória, almoço festivo e, antigamente, uma sessão do Legislativo carioca que o Vereador Wilson Leite Passos organizava.

Ele me pareceu o que era: menino tímido em excesso, mas com um olhar sério e benfazejo. Cumprimentou-me, como a tantos e tantos jovens monarquistas que o tinham por príncipe-herdeiro, de maneira cordialíssima e, por ser eu tão pouco mais velho — só 4 anos —, creio que se impressionou desde o início com a devoção que eu demonstrava ao que ele representava. O que ele representava? O Brasil.

Sendo eu verdadeiro cultor de História e de Genealogia desde pequeno, conhecia muito bem todos os antepassados de D. Pedro Luiz e falava deles com desenvoltura; sem usar de falsa modéstia, o que deploro — dizia Jean de La Bruyère que a falsa modéstia é o último requinte da vaidade —, posso imaginar que eu representei para o pequeno príncipe brasileiro um conhecimento impressionante para um garoto de 17 anos e isso fez com que ele me respeitasse desde o princípio. Tornei-me um próximo da família dele por causa de Prof. Otto de Sá Pereira, atual conselheiro-decano do IDII que havia sido assessor-chefe de D. Pedro Henrique (1909-1981), o neto e sucessor de D. Isabel (1846-1921).

Em 1997, organizei praticamente sozinho uma visita oficial dos Príncipes do Brasil a minha terra natal, a Imperial Cidade de Nichteroy; foram D. Luiz, que recebeu o Título de Cidadão Niteroiense, e os pais de D. Pedro Luiz, D. Antonio e D. Christine. Adolescente idealista e patriota, dediquei-me dali em diante com garbo ao monarquismo brasileiro, sempre idealizando com meu amigo Luis Afonso Queiroz, designer, dezenas de materiais gráficos exaltando os feitos e fatos da presença dos Bragança entre nós.

Iniciei minha graduação na PUC-Rio em março de 1999 e já servia honorariamente, também com muito orgulho, à Princesa Mãe do Brasil como seu secretário, desde meses antes. D. Maria da Baviera é a viúva de D. Pedro Henrique e mãe de 12 filhos, avó de quase 30 netos e bisavó já de alguns. O falecido Bispo de Petrópolis, D. José Carlos de Lima Vaz (1928-2008), dizia que ela fora, para a sociedade de seu tempo, um exemplo de “mulher do Evangelho”, ou seja, aquela que em vida de orações e provações, passa incólume por todos os obstáculos que a peregrinação terrestre impõe. D. Pedro e D. Maria representaram para os membros das aristocracias do Rio de Janeiro, de São Paulo ou do Paraná — onde viveram nos anos 1950 e princípios dos 1960 —, uma realeza desapegada das coisas comuns e sempre voltada às “coisas do Alto”. D. Maria é autora, só para que se tenha uma ideia, de uma catequese popular, Miche de Pain (“Pedaço de Pão”), com a qual ela lecionava para os funcionários de sua fazenda em Jacarezinho (PR).

Convivi com D. Pedro Luiz, fosse em Petrópolis, onde “ensinava” História do Brasil a ele e seus irmãos, ressaltando a heroicidade e a humanidade dos monarcas brasileiros e europeus dos quais descendiam, fosse no Rio de Janeiro, onde ele sempre estava com seus pais e onde depois passou a morar. Não éramos amigos, de forma alguma, até pela diferença de idade, mas pode-se dizer que nos conhecíamos bem. Eu por meu lado sempre mantendo uma distância respeitosa com aquele que era o meu futuro Imperador e ele sempre muito cordato e gentil, verdadeiramente principesco. Não é de dizer-se que não possuísse defeitos, pois é evidente que necessitava deles para ser um membro da espécie humana, mas é certo que suas qualidades transpareciam muito mais.

Uma coisa desde cedo ficou clara para mim: D. Pedro Luiz era o herdeiro do Brasil. Aquele Brasil que D. Pedro I e D. Leopoldina construíram com suas vidas e dedicações; D. Pedro II e D. Thereza Christina com suas obras educacionais e culturais e D. Isabel e D. Gastão com seu abolicionismo redentor. Aquele a quem eu enxergava como um futuro D. Pedro IV — em homenagem ao seu avô, que teria sido D. Pedro III — ou D. Pedro Luiz I, era um “menino boníssimo”, como sempre o definem tios, tias e parentes em geral. Recordo que D. Maria, com seu sotaque singular, sempre falava dele com um prazer enorme, ressaltando que sua inteligência, amor à família, afeição aos esportes, faziam dele um “queridinho” de várias Famílias reinantes e ex-reinantes da Europa: Luxemburgo, Bélgica, Áustria, Liechtenstein etc.

Esse menino esplêndido virou homem, um homem de Deus. Era jovem como todos os outros, mas também sabia ser seriíssimo. Pretendia se casar dentro dos costumes da antiga tradição capetíngia, francesa, portuguesa e brasileira por continuidade dinástica: os enlaces com égalité de naissance, tão fora de moda nos dias turbulentos e ignaros em que vivemos. Com menos de 18 anos, concluí um trabalho histórico-genealógico justamente sobre a linhagem materna de D. Pedro Luiz, a Casa de Ligne, oferecendo-o a D. Christine — que, juntamente com sua cunhada, a Princesa D. Maria da Graça, são das senhoras mais finas que já conheci em minha vida... Ali eu explicito que os Ligne possuem Ebenbürtgkeit com todas as casas da alta e da média realeza europeia, pois ainda que tenham perdido a mediatização que o Congresso de Viena concedeu aos desapossados de Napoléon Bonaparte em 1815, são a família principesca belga por excelência, senhores indiscutíveis da história do Hainaut por mais de 8 séculos.

D. Pedro Luiz, o desejado, o esperado, o amado, o querido, o estimado, voltou para junto do Todo-Poderoso em pleno céu do Oceano Atlântico. Quanto simbolismo, quanta significação teológica! Qualquer indício de sebastianismo aqui não é mera coincidência: Gilberto Freyre dizia que acreditar em D. Sebastião não é errado, apesar de isso não resolver nossos problemas — um amigo meu sempre mo lembrava. Contudo, o que dizer da discrepância existente entre a política brasileira atual e aquela conduzida pelo magnânimo tetravô de D. Pedro Luiz, tão bem elucidada em livro recente de José Murilo de Carvalho?

Repugnando veementemente o pensamento e a conduta dos pessimistas ou sordidamente adesistas que dizem ser a corrupção governamental uma sina irremediável e insuperável de nosso País, continuo a crer em um Brasil restaurado em sua decência. Parece óbvio que não há perspectiva de restaurar-se o Estado Monárquico brasileiro nos próximos anos, o que não é sinônimo de deliberar que isto seja impossível; em contrapartida, advogar que o Poder Moderador exista entre as instituições jurídicas da Res Publica e que possamos lançar mão deste remédio constitucional é um dever cívico de todos nós!

Em abril de 2007, fui convidado pela Revista BR HISTÓRIA (Duetto Editorial), de São Paulo, a escrever um texto sobre o Plebiscito de 21.04.1993 e a história dos príncipes de Orleans-e-Bragança. Assim finalizo o artigo A árvore imperial:

A maior parte dos monarquistas brasileiros deposita em D. Pedro Luiz (1983), primogênito de D. Antonio João, todas as esperanças e aspirações. O jovem príncipe, graduado em Administração pelo IBMEC do Rio de Janeiro, vive atualmente no Grão-Ducado de Luxemburgo, onde trabalha no sistema financeiro. O vigor da juventude e a seriedade de seu caráter são sempre apresentados, por familiares e amigos, como os fatores preeminentes para sua futura entronização.

Os súditos de D. Pedro Luiz — um Orleans-Bragança-Wittelsbach-Ligne-Bourbon-Nassau-Weilburg —, três vezes descendente direto de D. João VI e três vezes descendente colateral de Maurício de Nassau, imaginam que ele poderá ser no Brasil do século XXI uma espécie de D. João IV, fundador da dinastia de Bragança e restaurador da independência de Portugal em 1640, após 60 anos de domínio espanhol.

Pois bem, o príncipe-herdeiro dos sonhos de milhares de brasileiros, que também era um súdito belga e residente luxemburguês, voltava para seu trabalho, algo que encarava com uma gravidade fora do comum. Lembro-me da vez em que ele e eu estávamos no mesmo “frescão”, indo para o trabalho, no Centro do Rio de Janeiro: ele começara a estagiar semanas antes e estava nervoso com o fato de ainda não ter uma função definida no emprego. Queria demonstrar competência, queria experimentar suas habilidades.

Sempre me perguntei, sobretudo nos últimos dois anos, quando os caminhos da vida não mais me fizeram encontrá-lo, se de fato queria/ansiava o que lhe imputavam, afinal eis um fardo plenamente incomum para os de nossa geração; a resposta agora nada interessa, sendo a própria Divina Providência quem indica que nossas aspirações familiares, sociais, religiosas, políticas, econômicas, estão todas subordinadas a Seus alvitres, misteriosos e gloriosos ao mesmo tempo.

Nos últimos meses, o Instituto D. Isabel tem sofrido perdas enormes: em janeiro se foi o secretário Vanderli Teixeira, 27 anos, jovem portentoso, diretor da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos do Rio de Janeiro; em abril faleceu Dr. Juarez Távora, nosso presidente de honra, 77 anos e décadas de serviço e amor ao Brasil. Filho e homônimo do Marechal Juarez Távora (1898-1975), ele era procurador do Trabalho aposentado e se dedicava comprazido às atividades culturais e filantrópicas. Agora se vai D. Pedro Luiz, 26 anos, sócio honorário inato do IDII pelos nossos Estatutos Sociais, vez que é descendente da Redentora. Recebia nossas mensagens quase diárias e nele tanto esperávamos: que pudesse um dia ser no Brasil uma liderança moral capaz de arregimentar forças e impor à classe política nacional uma honradez e seriedade que a imensa maioria não possui. Se seria, ou não, coroado imperador, não importa. O que importa é que poderia ajudar a impedir que a nossa política continue sendo um lugar privilegiado para a ação de escroques e venais, bandidos disfarçados de autoridades.

Mas... o herdeiro da bonomia de D. João VI e da timidez de D. Pedro II, que resplandecia amabilidade em seus sorrisos, encontrou-se com seus avós São Luís de França, São Nun´Alvares de Portugal, Santa Edwiges, Santa Isabel da Hungria, Santa Isabel de Portugal e tantos outros que a Igreja ainda não canonizou, mas que reinam absolutos em nossos corações. Talvez o Príncipe fosse bom demais para o Brasil atual. Talvez a poética hebraica, representada pela sabedoria salomônica no 3º Livro de Provérbios, defina a questão:

Meu filho, não te esqueças de meu ensinamento e guarda meus preceitos em teu coração
porque, com longos dias e anos de vida, assegurar-te-ão eles a felicidade.
Oxalá a bondade e a fidelidade não se afastem de ti! Ata-as ao teu pescoço, grava-as em teu coração!
Assim obterás graça e reputação aos olhos de Deus e dos homens.
Que teu coração deposite toda a sua confiança no Senhor! Não te firmes em tua própria sabedoria!
Sejam quais forem os teus caminhos, pensa nele, e ele aplainará tuas sendas.
Não sejas sábio aos teus próprios olhos, teme o Senhor e afasta-te do mal.
Isto será saúde para teu corpo e refrigério para teus ossos.
Honra o Senhor com teus haveres, e com as primícias de todas as tuas colheitas.
Então, teus celeiros se abarrotarão de trigo e teus lagares transbordarão de vinho.
Meu filho, não desprezes a correção do Senhor, nem te espantes de que ele te repreenda,
porque o Senhor castiga aquele a quem ama, e pune o filho a quem muito estima.
Feliz do homem que encontrou a sabedoria, daquele que adquiriu a inteligência,
porque mais vale este lucro que o da prata, e o fruto que se obtém é melhor que o fino ouro.
Ela é mais preciosa que as pérolas, jóia alguma a pode igualar.
Na mão direita ela sustenta uma longa vida; na esquerda, riqueza e glória.
Seus caminhos estão semeados de delícias. Suas veredas são pacíficas.
É uma árvore de vida para aqueles que lançarem mãos dela. Quem a ela se apega é um homem feliz.
Foi pela sabedoria que o Senhor criou a terra, foi com inteligência que ele formou os céus.
Foi pela ciência que se fenderam os abismos, por ela as nuvens destilam o orvalho.
Meu filho, guarda a sabedoria e a reflexão, não as percas de vista.
Elas serão a vida de tua alma e um adorno para teu pescoço.
Então caminharás com segurança, sem que o teu pé tropece.
Se te deitares, não terás medo. Uma vez deitado, teu sono será doce.
Não terás a recear nem terrores repentinos, nem a tempestade que cai sobre os ímpios,
porque o Senhor é tua segurança e preservará teu pé de toda cilada.
Não negues um benefício a quem o solicita, quando está em teu poder conceder-lho.
Não digas ao teu próximo: Vai, volta depois! Eu te darei amanhã, quando dispões de meios.
Não maquines o mal contra teu vizinho, quando ele habita com toda a confiança perto de ti.
Não litigues com alguém sem ter motivo, se esse alguém não te fez mal algum.
Não invejes o homem violento, nem adotes o seu procedimento,
porque o Senhor detesta o que procede mal, mas reserva sua intimidade para os homens retos.
Sobre a casa do ímpio pesa a maldição divina, a bênção do Senhor repousa sobre a habitação do justo.
Se ele escarnece dos zombadores, concede a graça aos humildes.
A glória será o prêmio do sábio, a ignomínia será a herança dos insensatos.


Sucede-o seu irmão D. Rafael Antonio. Mas não o substitui, pois os seres humanos, na riqueza incomensurável da Criação, são individualíssimos e, portanto, insubstituíveis. Este é o sentimento, imagino, do próprio Rafael, ou de Amélia, da irmã caçula e de todos os membros de sua Família.

A eles todos, envio minhas condolências viscerais, que sei serem as de tantos compatriotas meus, rogando à Mãe de Deus e Nossa, a Virgem da Conceição Aparecida, que os reconforte na dor indescritível por que passam.

Que o Sagrado Coração de Jesus conceda a Suas Altezas a graça de manterem seus bens mais preciosos: a dignidade de seus ancestrais e a fé política e religiosa no Brasil.

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Deve-se visitar: www.idisabel.org.br/pedroluiz