sábado, 8 de novembro de 2008

A Monarquia brasileira e a República norte-americana nas lentes de um diplomata


Bruno de Cerqueira


Ao se propor investigar as relações bilaterais Brasil-EUA durante o período da Monarquia brasileira, o Embaixador Marcelo Raffaelli, atual presidente da Associação dos Diplomatas Brasileiros e nosso antigo representante junto ao GATT, adverte nas primeiras linhas do prefácio:

Esta não é uma obra de historiador. Não pretendi escrever um livro de história, mas apenas uma resenha de fatos que recolhi em arquivos dos Estados Unidos e do Brasil; com eles alinhavei esta narrativa, que cobre o período de 1822 a 1889, isto é, da independência do Brasil ao fim do Império.

A nota introdutória do autor é a peça-chave para a compreensão da obra A Monarquia e a República: aspectos das relações entre Brasil e Estados Unidos durante o Império, que a Fundação Alexandre de Gusmão publicou em 2006. Nos agradecimentos que precedem ao prefácio, o Embaixador Raffaelli cita vários diplomatas que o auxiliaram na produção do livro, mormente os Embaixadores Álvaro da Costa Franco e José Jeronimo Moscardo de Souza, “que tornaram possível a publicação desta obra” — donde se conclui que deve-se a eles dois a aprovação da FUNAG para a impressão, vez que um presidia o CHDD (Centro de História e Documentação Diplomática do Ministério das Relações Exteriores) e o outro, a própria FUNAG...

O livro tem cerca de 290 páginas, divididas em 11 capítulos e mais notas. A bibliografia é apresentada de forma pouco comum, separando por capítulos os livros utilizados . A obra é finalizada com um índice onomástico relativamente bem organizado. Nossa análise aqui se limitará a resumir os eixos centrais dos capítulos, que são, em grande parte, a compilação das correspondências diplomáticas dos arquivos brasileiros, estadunidenses e europeus  aos quais o autor teve acesso em suas três décadas de serviço à Chancelaria do Brasil.
Na orelha do livro, o Embaixador Álvaro da Costa Franco apresenta as idéias de seu colega da seguinte forma:

As relações entre o Brasil e os Estados Unidos, embora tenham sido objetos de valiosos trabalhos, continuam a demandar estudos que nos permitam bem compreender a crescentemente complexa trama de laços, de natureza política, econômica e cultural que unem os dois países.

O livro do Embaixador Marcelo Raffaelli nos convida a olhar estas relações de uma nova perspectiva, focando o período de nossa independência política até a proclamação da República.

Uma monarquia e uma república de vocação imperial que crescem e se desenvolvem em ritmos diferentes. O Brasil consolida fronteiras e se expande dentro dos limites praticamente traçados no período colonial. Os Estados Unidos, cumprindo o que vêem como um “destino manifesto”, expandem-se ate o Pacífico e preparam a projeção mundial do seu poder no século seguinte.

Nesse ínterim, é bastante válido salientar que, de fato, o livro de Raffaelli preenche lacuna, haja vista o pouco caso com que os historiadores brasileiros se dedicam às nossas relações bilaterais com grandes nações européias e os Estados Unidos, justamente quando estávamos intentando nosso state-building...

Ainda no prefácio, o autor ambientiza seu leitor em relação a alguns pormenores do século XIX, tais como as nomenclaturas diplomáticas e monetárias. Além disso, aponta nuanças entre Brasil e Estados Unidos, como se segue:

Ao se tornar independente, o Brasil tinha uma extensão territorial não muito diferente da atual, pois, se veio a perder a Província Cisplatina, mais tarde ganhou o Acre, A população era reduzida. Estimativas da época e outras, feitas no século XX, davam-lhe entre quatro e cinco milhões de habitantes.

Quanto aos Estados Unidos, ainda estavam longe das dimensões atuais, Em 1822, o país ocupava área correspondente a menos de 60% dos 7.830.000 quilômetros quadrados dos atuais 48 estados contíguos: ainda não lhe pertenciam os territórios dos atuais estados de Arizona, Califórnia, Idaho, Nevada, Oregon, Utah e Washington, quase todo o Texas, a maior parte do Novo México, etc, O recenseamento de 1820 encontrou uma população de pouco menos de 9.700.000 almas.

Em Reconhecimento do Brasil Independente, o autor analisa a forma pela qual o Manifesto de D. Pedro e José Bonifácio, de 6 de agosto de 1822 — considerado por dezenas de historiadores, com grande razão, a independência de ofício do Brasil, anterior, portanto, ao heróico Grito do Ipiranga  — começa a ser analisado pelas autoridades da República norte-americana e como o processo de reconhecimento por parte deles se estende até setembro de 1824.

Atuou como nosso representante em Washington o diplomata José Silvestre Rebello (*1778 †1884). O interessantíssimo deste capítulo é perscrutar como era difícil aos norte-americanos confiarem em uma independência à brasileira: monárquica, dinástica e católica.

Nas memórias do Secretário de Estado John Quincy Adams  (*1767 †1848), personagem que Raffaelli citará diversas vezes no livro, fica claro que as notícias que chegam aos Estados Unidos sobre o Brasil são, no mínimo, suspeitas... Não deixa de despertar curiosidade até que ponto o jeito brasileiro de emancipar-se e construir-se, mantendo laços claríssimos com a matriz lusa, não influenciou Adams e Monroe na (auto-afirmatória) doutrina que engendraram, onde a “América deveria ser para os americanos”.

A seguir, nosso autor mostra o quanto a delicada questão do tráfico negreiro pesava no processo de reconhecimento por parte dos Estados Unidos; somente a habilidade de Rebello conseguiu reduzir os preconceitos e as reservas de James Monroe e Quincy Adams, garantindo que D. Pedro I se batia pela extinção do “infame comércio” — o que, conforme sabemos hoje, não era apenas peça de retórica, visto que o imperador foi, sim, como bom pupilo de José Bonifácio, um abolicionista avant la lettre...

Em Os Chefes de Missão, o autor apresenta dados mini-biográficos de cada um dos diplomatas brasileiros e estadunidenses que representaram suas respectivas legações. Trata-se de um guia introdutório aos nomes que permeiam todo o livro e é extremamente louvável.

Foram 16 os enviados brasileiros, contra 17 dos Estados Unidos. A maior parte dos nossos era diplomata de carreira, enquanto entre os deles preponderaram militares e políticos, conforme indica Raffaelli:

Vários já tinham ou viriam a ter experiência militar, seja na guerra de 1812 contra a Inglaterra (Raguet), nas guerras contra os índios do Oeste (Webb) ou na guerra civil de 1865-69; depois de suas missões no Brasil, um iria lutar pelos Estados Confederados (Wise) e outro faria parte do exército da União (Schenck); dois haviam lutado do lado rebelde antes de vir para o Brasil (Hilliard e Jarvis). Trousdale foi ainda mais ativo, pois participou das guerras de 1812, contra os índios e contra o México. Alguns eram abertamente pela manutenção da escravidão, outros declaradamente contra. A grande maioria participou na política, ocupando cargos de governador, senador e/ou deputado de nível quer federal, quer estadual. Apenas de dois (Hunter e Partridge) pode-se dizer que tiveram longas carreiras no serviço diplomático. Vários escreveram livros ou artigos para a imprensa. Talvez porque houvessem ocupado posições importantes em seu país e ficassem irritados com a demora, ou mesmo procrastinação proposital, do governo brasileiro em tomar decisões, alguns revelaram traços de impaciência e, ocasionalmente, tiveram comportamento pouco diplomático. Uma nota trágica é que dois (Partridge e Adams) se suicidaram. Finalmente, um teve de terminar seus dias no estrangeiro, em exílio voluntário, por crime de peculato.

Já no capítulo Instruções aos Chefes de Missão, nosso autor revela quais as metas de ambos os governos em suas relações diplomáticas. Os principais interesses dos EUA sempre giravam em torno do aumento das exportações, do tratamento da nação mais favorecida e da diminuição gradual da influência do Reino Unido entre nós. Na sinuosa questão escravista, os ditames de Washington eram sorrateiros, deixando aos diplomatas britânicos a ênfase no combate ao tráfico, enquanto eles passavam por “conciliatórios e não ofensivos”...

Ao longo das décadas de 1820 até 1880 as Instruções Governamentais de ambos os países têm motivações diversas e sempre se relacionam às temáticas cogentes da política interna dos Estados. Raffaelli as resume detidamente, dando realce ao papel fundamental que elas exerciam sobre a ação dos cônsules ou encarregados de negócios.

No cap. 4 (Tráfico de escravos e escravidão), o Embaixador Raffaelli esmiúça o que chama, muito apropriadamente, de “o vergonhoso quarteto”: falsidade brasileira, hipocrisia norte-americana, cinismo britânico e lascívia portuguesa. Pois que nas trocas entre África e América eram os interesses comerciais desses povos que sobrepujavam, sempre, qualquer sentimento humanista contrário à escravidão.

Neste capítulo, em que nosso autor ressalva, contudo, que sem o apoio decisivo da opinião pública britânica de meados ao fim do Oitocentos, provavelmente nosso processo abolicionista tivesse sido ainda mais pachorrento do que foi, ele também faz questão de inserir, ao término, as expressões de James Watson Webb (*1802 †1884), em relação ao estatuto dos negros e mulatos no Brasil, quando não escravizados. A diferença com sua nação era patente, visto que “o negro é, socialmente, igual ao homem branco no Brasil” (p. 98).

A seguir, Raffaelli passa a analisar a rica fase da Guerra de Secessão (cap. 5), ocasião em que as opiniões brasileiras quanto aos nossos “irmãos do Norte” se dividiram, vez que os Estados Confederados eram escravocratas e angariavam a simpatia da maior parte dos dirigentes brasileiros de então...

Ressalta o Embaixador que os rebeldes farroupilhas haviam pedido apoio aos funcionários norte-americanos no Brasil, em princípios de 1840, o que foi veementemente negado pelo Chefe de Missão William Hunter (*1805 †1886). Quando a guerra foi deflagrada em território estadunidense (julho/1861), o Governo Imperial proclamou neutralidade, mas negou completamente a permissão de comércio bélico com os separatistas.

Contudo, a beligerância foi reconhecida oficiosamente pelo Império quando se deu o episódio do navio Sumter, em São Luís do Maranhão (setembro/1861), tendo o Presidente da Província aquiescido nas provisões demandadas pelos tripulantes.

Dali em diante as relações ficaram tensas e Webb, conforme salienta Raffaelli, agiu desmesuradamente inúmeras vezes, chegando a se tornar quase uma persona non grata na Corte brasileira. Logo adiante nosso autor relata a pitoresca visita dos príncipes de Bourbon-Orleans aos Estados Unidos, em plena guerra. O Príncipe de Joinville, acompanhado de seus sobrinhos Conde de Paris (neto e sucessor de Louis-Philippe na Casa de Orleans) e Duque de Chartres e do filho, Duque de Penthièvre, ouviram algo interessantíssimo do Secretário de Estado William Seward (*1801 †1872), sobre a mediação de D. Pedro II ser desejada pelos norte-americanos, em contraposição à oferecida — e indesejada — do então Imperador dos Franceses, Napoléon III...

Passou a entender o Governo Imperial brasileiro de então que o demandado pelo Governo da União Estadunidense era excessivo em relação ao Brasil, pois que nós tínhamos postura eminente neutra e não visávamos reconhecer os confederados, ainda que dispusessem de governo de facto. Seguiram-se pequenos entreveros até o próprio fim da guerra civil deles, em abril de 1865. Em maio seguinte, nosso Governo retirou aos confederados sua categoria de beligerantes e as relações voltaram à amistosidade.

No capítulo seguinte de A Monarquia e a República, Raffaelli recorda, contudo, as problemáticas que existiram entre o Império do Brasil e os Estados Unidos no que concerne ao Rio Amazonas. Em A abertura do Rio Amazonas, (cap. 6), apontam-se as origens da vontade de negociantes norte-americanos navegarem livremente pelo Amazonas; já nos anos seguintes ao reconhecimento, surge uma proposta da South American Steam Boat Association of New York, que inicialmente não é rechaçada por Rebello, mas que depois é abortada pelo Governo Imperial.

Durante toda a década de 1850, os norte-americanos intentaram fortemente a permissão de navegação e comércio no Rio Amazonas, sempre ensejando oportunidades para tanto. O Governo do Peru, por exemplo, foi envolvido pelo dos Estados Unidos em um acordo pelo qual os navios norte-americanos poderiam percorrer livremente as águas amazônicas peruanas, o que gerou contendas com o Brasil e obrigou a república nossa vizinha a uma reinterpretação desse acordo (1853), negando, desta feita, igualdade entre brasileiros e estadunidenses na navegação da parte peruana do Amazonas...

Além disso, de nossa parte, o Barão (dep. Visconde) de Mauá, ficou autorizado por decreto imperial (agosto/1852) a monopolizar a navegação do Amazonas por 30 anos, o que irritou profundamente os “yankees”.

No final de 1853, o Chefe de Missão Schenck voltou aos Estados Unidos e para cá foi designado William Trousdale (*1790 †1872), antigo governador do Tennessee. Este chegou ao Rio de Janeiro com o firme propósito de convencer as autoridades brasileiras a cederem na navegação.

Eram contrários, todavia, os pareceres da Seção de Negócios Estrangeiros do Conselho de Estado — o Conselho era o órgão máximo de governança do Império, dado que auxiliava o monarca em suas decisões de Política Externa e nas mais graves também da Política interna —, que sempre apontavam o racismo e o elitismo típico dos “anglo-americanos” como ultra-prejudiciais ao desenvolvimento da região amazônica, que era em seu maior quinhão, brasileira.

Ate ser substituído em 1857, Trousdale procedeu a inúmeras tentativas, todas vãs, de convencer nossos estadistas a abrirem a navegação. Com o nosso famoso “jeitinho”, Sua Excelência era diligentemente engabelado...

Por outro lado, nosso embaixador-autor não deixa de revelar-nos a inércia e eterna procrastinação de nossos homens de governo daquela centúria, ao impedir a navegação aos estrangeiros e, simultaneamente, nada realizar para que nossas próprias forças nacionais o fizessem. De maneira que somente em setembro de 1867, se permite a livre navegação no Amazonas e no São Francisco, mas aí a conjuntura e os interesses nacionais brasileiros já haviam se alterado drasticamente, com o irrompimento da Guerra do Paraguai, dois anos antes...

Em Arbitragens, bons ofícios e mediações, Raffaelli recorda que, a despeito de nossas eventuais rusgas, o século XIX foi marcado, em geral, pela amizade e colaboração de brasileiros e estadunidenses. Nas Alabama claims, em 1871, que opunha EUA e Reino Unido, o Brasil posicionou-se a favor do primeiro. Já nas petições dos herdeiros de Lorde Cochrane, mercenário inglês que auxiliou D. Pedro I nas guerras de Independência, os norte-americanos foram favoráveis ao Brasil (1873/74). Finda este capítulo lembrando que na Guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai, o governo dos Estados Unidos se posicionou de maneira eqüidistante, oferecendo serviços que, sendo recusados, não foram “impostos”.

No cap. 8 (Diplomatas pouco diplomáticos), o Embaixador Raffaelli historia os inúmeros maus procedimentos que alguns dos ministros norte-americanos tiveram na Corte carioca. Henry Alexander Wise (*1806 †1876), que atuou aqui de 1844 a 1847, gerou o conflito do navio Porpoise (1845) e o dos marinheiros embriagados — sempre (!) — do Soratoga, às vésperas do batizado de D. Isabel (15.11.1846), segunda filha e futura herdeira de D. Pedro II. Tantas fez o rabugento Wise, que de “sábio”, nada tinha, que foi retirado do Brasil às pressas por seu governo, em princípios de 1847, sendo substituído por David Tod (*1805 †1868), que representou os EUA de 1847 a 1851.

O já citado James Webb foi outro que deixou péssimas impressões no Brasil, em virtude de sua imprudência. Os atritos quase sempre se davam por questões relacionadas a navios mercantes e suas tripulações. O desfecho de cada uma das questiúnculas que daí nasciam é analisado de maneira pormenorizada pelo nosso autor neste capítulo.

No texto seguinte, Diplomatas brasileiros e os EUA, Raffaelli relata as apreciações de nossos agentes em terras estadunidenses. Alguns comentários dos brasileiros são estranhos, outros perspicazes:

Algumas reflexões dos diplomatas brasileiros sobre a psique do povo norte-americano seriam surpreendentes para este, pois o anglo-saxão costuma aliar volubilidade e inconstância de ter aos povos latinos e não a si mesmo. A muito compreensível turbulência por que passavam os Estados Unidos no períofo entre a eleição e a posse de Lincoln, dada a incerteza quanto ao que adviria das intenções separatistas de alguns estados da União e qual seria a reação do presidente eleito, provocou o seguinte comentário de Miguel Maria Lisboa:
“O que fará Mr. Lincoln depois do dia 4 de março não é fácil conjecturar, pois neste país, por efeito tanto da volubilidade do caráter nacional dos habitantes como da natureza das instituições políticas, as causas que podem influir sobre o ânimo do futuro Presidente, variam com tanta rapidez e incongruência, que o que parece hoje provável, pode amanhã ser impossível.” (p. 227)

No penúltimo capítulo do livro, Os brasileiros aos olhos dos americanos, Marcelo Raffaelli faz concisas, ainda que excelentes anotações acerca das observações dos norte-americanos envers nous. É o caso, por exemplo, da imensa simpatia e admiração que a maior parte deles, governantes e povo, nutriam pelos soberanos e a família reinante do Brasil. Além de D. Pedro II ser popular nos Estados Unidos, como o mais longevo chefe de estado sul-americano e o único a visitar-lhes por ocasião do Centenário da Independência (1876), os diplomatas norte-americanos também demonstravam grande reverência pela Imperatriz (D. Thereza Christina) e as Princesas (D. Isabel e D. Leopoldina Thereza), visto que estas os tratavam com muita distinção e apreço. O depoimento do Chefe de Missão Thomas Osborn (*1836 †1898), de tão elogioso a D. Thereza, chega a ser tido por nosso próprio autor como “exagerado”...

Seja como for, o interessante é notar que todo o republicanismo dos norte-americanos não os cegava perante a popularidade, discrição, lhaneza e cordialidade dos príncipes brasileiros do séc. XIX, o que é fulcral para entender que não foi este, em tempo algum, motivo de discórdia entre nós e eles, a forma do governo, como alguns autores apontam, de forma descuidada.

A conclusão do livro se dá com o cap. 11, Fim do Império, onde o autor não se detém em explicações sobre a queda da Monarquia, apontando apenas que ela, enquanto regime de facto, após o 17 de novembro de 1889 (banimento da Família Imperial), foi rapidamente aceita pelo Governo dos Estados Unidos da América, pela óbvia abertura que poderia representar o alijamento do trono nas negociações diplomáticas e a mímesis trôpega da República deles em terras brasílicas...

Os equívocos desse tipo de conduta em nossa história foram analisados pelo jornalista Eduardo Prado em A Ilusão Americana, livro que saiu na ditadura de Floriano Peixoto (1893) e conduziu seu autor ao exílio...


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BIBLIOGRAFIA

            PRADO, Eduardo. A Ilusão Americana. 3ª. edição. São Paulo: Editora Brasiliense, 1961.
            RAFFAELLI, Marcelo. A Monarquia e a República: aspectos das relações entre Brasil e Estados Unidos durante o Império. Rio de Janeiro: CHDD/FUNAG, 2006.
            SAHLINS, Marshall. Ilhas de História. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990.

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NOTAS

Resenha apresentada ao Programa de pós-graduação lato sensu em Relações Internacionais, do Instituto de Humanidades da Universidade Cândido Mendes, em 8 de novembro de 2008.

Bruno da Silva Antunes de Cerqueira (*1979) é graduado em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e pós-graduado em Relações Internacionais pela Univ. Cândido Mendes. É organizador de D. Isabel I a Redentora, textos e documentos sobre a Imperatriz exilada do Brasil em seus 160 anos de nascimento. (IDII, Rio de Janeiro, 2006) e autor de Descendência de D. Pedro IV, Rei de Portugal e I Imperador do Brasil, in História Genealógica da Casa Real Portuguesa. vol. XV (QuidNovi e Academia Portuguesa da História, Lisboa, 2008).

A explicação fornecida em relação à não-cronologização dos capítulos está na p. 16, quando Raffaelli diz preferir seu livro em torno de temas e não de uma “apresentação cronológica”.

Principais: Arquivo Histórico do Itamaraty (RJ), Seção de Documentação Parlamentar da Câmara dos Deputados (DF), Biblioteca do Congresso e National Archives II nos Estados Unidos e Public Records Office, em Surrey (Inglaterra).

Tomemos “heróico” aqui sem deboche ou escárnio, na apreciação de M. Sahlins em Ilhas de História...

Filho de John Adams, segundo Presidente dos Estados Unidos, será ele próprio Presidente (1825-29), em substituição ao Presidente Monroe.



sexta-feira, 8 de agosto de 2008

História genealógica da Casa Real portuguesa


História genealógica da Casa Real portuguesa

Bruno de Cerqueira[1]


Com título tão auspicioso, convidou-me a secretária do IHGRJ, caríssima Profª. Rogéria de Ipanema, a palestrar sobre a vinda da Corte Portuguesa ao Brasil em seu aspecto histórico-genealógico. Desde o início, contudo, advoguei que o limite de tempo para exposição (30 minutos) não permitiria, em hipótese alguma, que eu pudesse sequer resumir a história das dinastias portuguesas.

Com efeito, o demandado era que eu apenas introduzisse a história genealógica da descendência de D. João VI, o monarca luso-brasileiro que tanto festejamos neste Bicentenário. A propositura e a conseqüente limitação de conteúdo me animaram bastante.

Antes, contudo, de iniciar a narrativa da história da descendência de D. João, é forçoso, necessário e imperativo homenagear, aí sim, o autor da verdadeira História Genealógica da Casa Real Portuguesa, o cônego setecentista D. Antonio Caetano de Sousa (*1674 †1759), cuja obra magna acaba de ser reeditada em Portugal, pela Academia Portuguesa da História e a Editora QUIDNOVI[2]. Tive eu a honra de ser chamado, juntamente com a Profª. Dra. Isabel Lustosa, a dar conta da descendência de D. Pedro I no Volume XV da obra, que constitui uma complementação à coleção original, haja vista ter ela terminado com a progênie dos filhos de D. João V o Magnânimo (*1689 †1750), Rei de Portugal a quem D. Antonio Caetano servia.

Dito isso e consignado o devido preito, passo a comentar — não mais do que isso — o que constitui a história genealógica de D. João VI e sua descendência e em que medida isso importa na análise e apreciação dos fatos que conduziram a antiga colônia luso-americana a se tornar o Império do Brasil.

A importância dessa história genealógica é bem maior do que podem supor os desleixados historiadores brasileiros que menosprezam a Genealogia e seus aportes e suportes ao exercício da historiografia. Sob não poucos pontos de vista, o Brasil independente é fruto de acordos diplomáticos, arranjos dinásticos e jogos políticos bastante bragantinos.

Os historiadores que, em todo século XX, tentaram negar aos Bragança o seu lugar na edificação do Estado e da própria nacionalidade, conseguiram muito parcialmente fazê-lo. Se por um lado existe um esforço notório de construir uma nova memória oficial a partir da República de 1889 e neste esforço coube menosprezar o legado de D. João, dos dois D. Pedro e de D. Isabel, por outro, no que tange à memória popular, é inegável que os membros da realeza, por mais descurados que tenham sido em suas apreciações biográficas até aqui, são estimados e quiçá, alguns, venerados, pelos brasileiros em geral.

A historiadora e antropóloga Lilia Moritz Schwarcz, autora do célebre trabalho de história da iconografia As Barbas do Imperador[3], acaba de abordar a situação em entrevista à Revista de História da Biblioteca Nacional. À pergunta “É possível comparar o sucesso das celebrações pelo Bicentenário da chegada da Corte este ano com o relativo fracasso da festa pelos 500 anos do Brasil em 2000?”, ela respondeu: “Não é tão fácil manipular as pessoas. É necessário que haja um desejo da manipulação e uma recepção favorável. O tema dos 500 anos não é tão popular, pois destituído de qualquer aura de sacralidade. (...) a celebração não pegou, não teve impacto popular.” Depois, ao ser questionada sobre por que “D. João pegou”, isto é, por que as festas dos 200 anos da Corte no Brasil foram bastante celebradas por cariocas e outros povos brasileiros, ela respondeu: “É possível arriscar dizer que somos absolutamente órfãos da realeza. Quando comecei a pesquisa para escrever As Barbas do Imperador, fui pela primeira vez ao carnaval no Rio. Na avenida, parecia que estava passando um verdadeiro desfile de reis e rainhas, príncipes e princesas. Percebi que no Brasil todo mundo que é bom vira rei: ‘rei da voz’, ‘rei Pelé’. Isso denota um imaginário forte e enraizado.”[4]

Nos comentários da professora da USP, se encontram dois elementos interessantes para o debruçar de qualquer historiador: o imaginário monárquico que permeia os brasileiros e o saldo extremamente positivo das figuras do período joanino e do restante da Monarquia no Brasil (1808-1889) na memória popular. Embora correlatos, eles não se igualam.

Se é fato que o rei “fujão” e “comedor de franguinhos” da historiografia de um Luiz Edmundo (*1878 †1961)[5], por exemplo, ainda persistia nas mentes de muitos brasileiros até o Bicentenário —sobretudo por causa da massiva impressão dessas informações nos livros didáticos e para-didáticos com que as crianças aprendem História do Brasil nas escolas —, também é fato que a imagem de D. João como monarca habilidoso e perspicaz, agradável a um historiador como o grande Oliveira Lima (*1867 †1928)[6], tinha inumeráveis defensores.

O interessante é notar que, talvez pela “orfandade da realeza” — no dizer de Lilia Schwarcz — D. João e sua linhagem cada vez mais têm sido exaltados aqui. Se conseguirmos depreender os porquês dessas permanências, quem sabe não possamos analisar alguma espécie de monarquismo ou de sebastianismo difuso dos brasileiros? Dentro do estudo a que me dedico desde os mais tenros anos, a monarcologia, elucidar nosso inebriamento envers nossos príncipes, é algo fulcral.

A verdade é que interpretar o Brasil enquanto legado da Casa de Bragança e seus conselheiros e ministros de Estado (1640-1808-1889) e, antes deles no trono de Portugal, dos Aviz (1500-1580) e dos Habsburgo espanhóis (1580-1640), é algo tão válido quanto enxergar este mesmo Brasil como fruto do trabalho escravo dos africanos trazidos aos milhões nos séculos de colonização que antecederam a transmigração da Corte e nas décadas que a ela se seguiram...

Destarte, o sui generis Brasil nasceu como uma monarquia americana, com dinastia européia e súditos ultra-mestiços. Nada mais freyreano. Aliás, o gênio de Apipucos várias vezes comentou nossa epopéia monárquica. Certa feita declarou que “graças aos Bragança, o Brasil, que não tem neve, tem príncipes...”[7].

D. João e sua progênie

O casamento de D. João com sua prima, D. Carlota Joaquina (*1775 †1830), Infanta de Espanha, Princesa de Bourbon-Anjou etc., ocorreu em 25 de maio de 1785 e foi consumado cerca de cinco anos mais tarde, quando a Princesa do Brasil — título a que fazia jus desde o consórcio com o herdeiro da coroa lusa —, já havia tomado “compleição de mulher”.

A estirpe proveniente de D. João e D. Carlota certamente os coloca na condição de Avós da Europa, nomenclatura com a qual alguns historiadores costumam classificar os soberanos Christian IX da Dinamarca (*1818 †1906) e Victoria I da Grã-Bretanha (*1819 †1901), que são obviamente de duas gerações posteriores, mas cuja descendência se encontra mais presente nas dinastias protestantes e greco-ortodoxas.

Obras clássicas na abordagem do tema são o livro de Frederico Gavazzo Perry Vidal[8], primeiramente publicado em 1923 — Descendencia de S. M. El-Rei o Senhor Dom João VI (28º Rei de Portugal) — e a coleção Nobreza de Portugal e do Brasil, que traça em cada capítulo a biografia do monarca em questão e sua descendência imediata[9]. O livro de Perry Vidal teve republicação há mais ou menos cinco anos, em São Paulo e em Portugal. Trabalho genealógico e iconográfico de fôlego, não abrangeu, contudo, dados biográficos dos citados.

Sobre a união de D. João e D. Carlota já se escreveram centenas e centenas de páginas: as laudatórias e as execratórias. Dada a revisão historiográfica dos últimos anos[10], a figura da rainha-consorte de D. João tem tomado novos ares. Está longe de ser canonizada. Mas só de ter deixado de ser demonizada, já valeu, e muito, a pena. Afinal, D. Carlota Joaquina esposa e mãe foi sempre uma incógnita aos estudiosos do Brasil joanino. Havia uma equivalência surda entre legenda negra e história biográfica para essa soberana portuguesa, que agora ruiu. Vale lembrar, contudo, que foram necessários quase 200 anos para que isso ocorresse...

A descendência do casal é motivo de várias pilhérias, pela suspeita da infidelidade conjugal de D. Carlota. Ainda que não haja nenhum indício documental das traições da Rainha, é certo que ela tendia ao adultério. Sempre advogo, contudo, que a mentalidade das princesas até o século XIX não comportava uma clivagem entre sua condição de “eleita pelos Céus” para a continuidade das dinastias e das monarquias — aliás, comumente chamadas de repúblicas, vez que não se fazia diferenciação ontológica entre uma comunidade nacional (res publica) e uma forma de organização estatal em que o chefe do Estado fosse outro que não o monarca — e uma pessoa com desejos próprios, acima daqueles interesses societais.

Desse modo, é bastante pouco provável que as rainhas e as princesas adúlteras produzissem frutos de suas relações extra-maritais, pois sua profissão de fé cristã arraigada e atávica não o permitia. O que era prática corrente, não só entre elas, como entre todas as mulheres nobres ou comuns, era o aborto, cuja condenação moral era tênue, mesmo pelas autoridades eclesiásticas. Santo Tomás de Aquino (*1225 †1274), por exemplo, não classificava como pecado mortal, na Summa Theologica, o aborto praticado até o terceiro mês de gestação...

Fosse a protestante Elizabeth I da Inglaterra (*1533 †1603), a ortodoxa Yekaterina II da Rússia (*1729 †1796)[11], ou a nossa católica D. Carlota Joaquina, essas monarcas tidas por inimigos políticos como “Messalinas”, provavelmente, não passavam de mulheres a tentar encontrar no mundo ultra-patriarcalista e em grande medida misógino em que viviam, arestas para a realização de motivações/anseios/demandas pessoais. Tem sido esta, em geral, a visão dos historiadores, mormente das historiadoras, que se dedicam à análise de gênero dos personagens femininos demonizados em certas obras clássicas da historiografia.

Todavia, é necessário ressalvar, em nome do espírito anti-generalista do historiador, que se as princesas européias do Medievo ao Renascimento tinham uma determinada tendência no agir, isso se alterará parcialmente com o advento dos tempos modernos. Ainda assim, as exceções confirmarão a regra, no que tange ao pavor que a imensa maioria delas sentia do Inferno e, portanto, da infidelidade conjugal e de uma eventual procriação não-dinástica como geradora desse “destino espiritual”.

Voltando a D. João e D. Carlota, de seu amor endogâmico[12] e catolicizado[13] nasceram nove dinastas:

  1. D. Maria Thereza (*1793 †1874). Princesa da Beira, como ficou conhecida toda a sua vida, mesmo na velhice. Perdeu o título logo que nasceu o próximo irmão e, mais tarde, quando ele morreu e D. Pedro de Alcântara assumiu a titulatura. Foi o primeiro membro de uma realeza européia a contrair núpcias na América (1810), quando se casou com o primo D. Pedro Carlos (*1786 †1812) e deu à luz o primeiro príncipe europeu nascido aqui: D. Sebastião Gabriel (*1811 †1875), Infante de Espanha e de Portugal. A descendência do filho único de D. Maria Thereza é tratada por mim na mini-biografia dela apresentada no Museu do Primeiro Reinado, em 25.06.2008.
  2. D. Antonio Pio (*1795 †1801). Príncipe da Beira. Criança enfermiça, teve a mesma sina que todos os primogênitos da Casa de Bragança[14].
  3. D. Maria Izabel (*1797 †1818). Infanta de Portugal e Rainha de Espanha pelo casamento com o tio D. Fernando VII (*1784 †1833), celebrado em 1816. Gerou duas filhas, mortas ao nascerem. No segundo parto, a Rainha D. Maria Izabel foi morta pelos médicos, na tentativa de salvar a criança...
  4. D. Pedro de Alcantara (*1798 †1834). Príncipe da Beira etc. 29º Rei de Portugal (1826). Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil (1822). Ao fim da vida, usou o título de Duque de Bragança e tutor e natural defensor da Rainha de Portugal, D. Maria II.
  5. D. Maria Francisca de Assis (*1800 †1834). Infanta de Portugal e Infanta de Espanha, pelo casamento com o tio D. Carlos María Isidro (*1788 †1855). Geraram os Infantes D. Carlos (*1818 †1861), D. Juan (*1822 †1887) e D. Fernando (*1824 †1861), que brigaram pela sucessão do trono com a prima-irmã D. Isabel II de Espanha (*1830 †1904).
  6. D. Izabel Maria (*1801 †1876). Infanta de Portugal e Regente do Reino (1826-1828). Apesar de se ter planeado seu consórcio com o sucessor da Coroa austríaca em 1816, Arquiduque herdeiro Ferdinand (*1793 †1875), futuro Ferdinand I, não logrou êxito o Marquês de Marialva nas tratativas. D. Izabel Maria foi uma princesa triste e, ao que parece, extremamente neurastênica. De qualquer forma, coube-lhe governar Portugal nos duríssimos dois anos que se seguiram à morte de D. João VI. Morreu idosa e caquética em Benfica, tendo feito três peregrinações a Roma[15].
  7. D. Miguel Maria do Patrocínio (*1802 †1866). Ver abaixo.
  8. D. Maria da Assumpção (*1805 †1834). Infanta de Portugal. Morreu solteira em Santarém, após ter vivido uma vida de dedicação à mãe e ao irmão D. Miguel.
  9. D. Anna de Jezuz Maria (*1806 †1857). Infanta de Portugal e Marquesa de Loulé pelo casamento com Nuno José Severo de Mendoça Rolim de Moura Barreto (*1804 †1875), 2º Marquês e 1º Duque de Loulé, 9º Conde de Vale de Reis, 24º Senhor de Azambuja etc.
    A descendência da Infanta D. Anna de Jezuz Maria é bastante grande, incluindo-se não somente a casa ducal de Loulé, como a casa marquesal de Funchal e as casas condais de Belmonte, de Linhares, de Mendia, de Paraty, de São Martinho, de Azambuja, de Marim, da Figueira, de Proença-a-Velha etc. Há ainda várias casas titulares italianas e espanholas descendentes da Infanta.

Na vida familiar, D. João se alegrava mais nos momentos em que estava com as filhas queridas (D. Maria Thereza, D. Izabel Maria) ou quando ainda viviam a mãe e as tias, D. Maria Anna Josefa (*1736 †1813) e D. Maria Francisca Benedita (*1746 †1829), com quem partilhava do gosto por orações e música sacra.

O relacionamento com a esposa teve altos e baixos desde o início do enlace. Trazida menina para a Corte lisboeta, D. Carlota Joaquina era extremamente ciosa de sua condição de infanta espanhola e princesa bourbônica. Identificava a parcimônia e a introversão do marido com as feições dos membros da Casa de Bragança e não se acostumava a isso. Em certo sentido, a vida de D. Carlota foi toda ela uma sucessão de frustrações. Nota-o Francisca Nogueira de Azevedo nas pesquisas que realizou nos últimos vinte anos em arquivos espanhóis, portugueses, brasileiros, argentinos e uruguaios e que embasam seu livro Carlota Joaquina na Corte do Brasil, saído em 2003.

Costumo brincar com a história de D. João e D. Carlota comparando suas carícias/repulsas com a própria relação de amor/ódio entre portugueses e espanhóis. A semelhança não é pequena... Seja como for, a descendência do casal é ilustríssima, através de seus dois filhos homens.

Descendências de D. Pedro e D. Miguel

Dentre os netos de D. João VI, dois serão monarcas célebres: D. Maria II de Portugal e D. Pedro II do Brasil. O último é tido por alguns autores, entre os quais me incluo, como fortemente parecido com o avô: D. Pedro II podia ser um perfeito Habsburg fisicamente, mas tinha um certo conservantismo melomaníaco e nostálgico bem bragantino...

Outros dois netos serão igualmente célebres, não enquanto monarcas reinantes, mas enquanto Pretendentes: D. Miguel (II) de Portugal (*1853 †1927) e D. Carlos (VI) de Espanha, este já citado, filho de D. Maria Francisca de Assis.

Da descendência do primogênito de D. João, nosso D. Pedro I (D. Pedro IV dos portugueses), procede a Casa Imperial do Brasil que reina aqui de 1822 a 1889; a Casa Real de Portugal (dinastia Bragança-Saxônia-Coburgo-Gota), que reina de 1826 a 1910; a Casa Real da Saxônia, a Casa Imperial da Áustria, Real da Hungria e da Bohêmia etc.; a Casa Principesca de Hohenzollern e a Casa Real da Romênia; a Casa Real da Sérvia; a Casa Real da França; a Casa ducal de Magenta; a Casa principesca de Orleans-e-Bragança; um ramo da Casa Real dinamarquesa e um da Casa Ducal de Saxe-Coburgo-Gotha.

Além disso, das linhas legitimadas de D. Pedro, provêm: em Portugal, os Condes de Seisal, os Viscondes de Asseca, os Condes de Carnide; na Alemanha, os Condes de Treuberg e Barões de Holzen, os Barões de Tanzl-Trazberg etc. No Brasil, a descendência dos Condes de Iguassu (ramo dos Caldeira Brandt) e inúmeras outras linhagens nobres nacionais.

D. Miguel era o rebento do casal real no qual mais dúvidas de paternidade se lançavam. Muitos cronistas contemporâneos o descreviam como fruto de uma ligação da Rainha com o Marquês de Marialva.[16] Na hipótese de ser crível esta historieta de alcova, então a varonia da atual Casa Real portuguesa é de Meneses... Conforme teoria já exposta, tendo a não crer nesta hipótese.

De qualquer forma, no tortuoso relacionamento que teve El-Rei D. João seja com o primogênito, seja com D. Miguel, é certo que os dissabores foram muitos. No primeiro caso, pelo excesso de intrigas fomentadas pelos conselheiros de D. João com seu herdeiro e, no segundo, por causa do amor edipiano extremado de D. Carlota por D. Miguel.

A descendência de D. Miguel é conhecidíssima na Europa, por contar, ainda hoje, com monarcas reinantes. O atual Rei dos Belgas, Albert II (*1934), é trineto de D. Miguel; seu sobrinho, o atual Grão-Duque de Luxemburgo, Henri I (*1955), é um trineto-tetraneto[17]; o Príncipe de Liechtenstein, Hans-Adam II (*1945), é outro trineto.

Aliás, a bisavó de Henri, a Grã-Duquesa consorte Maria Anna de Luxemburgo (*1861 †1942), foi outra neta de D. João VI que gozou de muita fama na Europa. Nascida no exílio austríaco de seu pai, enamorou-se do príncipe-herdeiro de Nassau (dinastia Nassau-Weilburg), um protestante, na década de 1880. O casamento foi adiado por anos e anos, pela falta do beneplácito do pai do rapaz, o velho Duque Adolf de Nassau[18] (*1817 †1905) e os escrúpulos da viúva de D. Miguel, D. Adelaide[19]. Finalmente, em princípios de 1893, o Papa Leão XIII consentiu na união, que se realizou com toda pompa no castelo bávaro de Fischhorn, já sendo o noivo o Grão-Duque hereditário Guillaume Alexandre de Luxemburgo[20], em 21 de junho de 1893. A história é rapidamente contada pela página oficial da Corte grã-ducal luxemburguesa:

En 1884, Guillaume avait demandé à son père l'autorisation de mariage avec la princesse Marie-Anne de Bragance, Infante du Portugal, mais Adolphe refusa car la Maison de Nassau était luthérienne, alors que la princesse était catholique. Étant devenu Grand-Duc de Luxembourg, pays très catholique, Adolphe révisa son opinion et donna son autorisation en 1893.

Le 22 juillet 1893, le jeune couple fit son entrée solennelle au Luxembourg. Ils choisirent le château de Berg comme résidence.[21]


O Grão-Duque Guillaume IV (*1852 †1912) reinou somente por três anos, logo adoecendo gravemente. Foi então que ele designou a esposa como Regente do Grão-Ducado, cargo em que ela permaneceu até a maioridade da primogênita do casal (Marie-Adelaïde), que assumiu o trono em 18 de junho de 1912.

D. Maria Anna de Bragança, Grã-Duquesa Mãe de Luxemburgo, refugiou-se com sua família em Portugal em maio de 1940, quando os nazistas invadiram o Grão-Ducado, até outubro do mesmo ano, quando partiram para a América do Norte. Pouco tempo depois, sua filha caçula, Sophie de Luxemburgo (*1902 †1941), Princesa Ernst Heinrich da Saxônia[22], faleceu em Munique, o que a fez adoecer. Meses depois, em 1º de agosto de 1942, ela findou seus dias em Nova York, após uma cirurgia. Está sepultada na Catedral de Luxemburgo e sua memória é bastante presente entre os luxemburgueses.


O império do tempo:
príncipes pedristas e miguelistas se unem

Em 3 de julho de 1993, o Príncipe hereditário de Liechtenstein, Alois (*1968) — filho de Hans-Adam II — se casou na Igreja de São Floriano, em Vaduz, com a Princesa Sophie da Baviera (*1967), neta de Albrecht (*1905 †1996), Chefe da Casa Real e Duque da Baviera. O Augusto Senhor Albrecht era um Wittelsbach und Wittelsbach, pois filho do último Príncipe-herdeiro da Baviera, Rupprecht (*1869 †1955) e da Princesa Marie Gabrielle (*1878 †1912), Duquesa em Baviera — ramo caçula da dinastia Wittelsbach donde provém a celebérrima Sissi, tia de Marie Gabrielle. Ocorre que a mãe desta era justamente a Infanta D. Maria José, quarta filha de D. Miguel, citada em nota acima.

Isto significa que a endogamia dos Bragança-descendentes persiste de forma pujante. Mas o interessante é notar as uniões que os descendentes de D. Pedro e D. Miguel celebraram, durante todo o século XX. Uma das primeiras já citei acima, sem especificar: o casamento de Sophie de Luxemburgo com Ernst Heinrich da Saxônia em abril de 1921. Outra mais conhecida e muito frutuosa foi a do futuro herdeiro do Império austro-húngaro-tcheco, Karl[23], em outubro de 1911, com a prima Zita de Parma. Karl é o Bem-Aventurado Carlos, desde outubro de 2004, quando o Papa João Paulo II o beatificou em Roma, perante vintenas de descendentes de D. João VI...

Sobre essas alianças pedro-miguelistas, comentei:

Outra união fundamental para a superação definitiva de qualquer resquício da velha guerra entre portugueses absolutistas e liberal-constitucionalistas foi o consórcio do neto do Manno Miguel — D. Duarte Nuno de Bragança (*1907 †1976) — com a bisneta do Pedrinho — D. Maria Francisca de Orleans-e-Bragança (*1914 †1968) —, celebrado com enorme pompa na Catedral de São Pedro de Alcântara (Petrópolis), em outubro de 1942. O casal gerou o atual Duque de Bragança, D. Duarte Pio (*1945), de jure D. Duarte III, Rei de Portugal...
Boda menos retumbante, mas igualmente jubilosa para a Realeza brasileira, foi o do já citado Príncipe D. Antonio João do Brasil com sua prima, a Princesa belga Christine de Ligne (*1955), que se realizou em Beloeil (Hainaut), em 1981, e cuja descendência garantiu a continuidade da Casa Imperial brasileira. D. Christine é filha da Princesa Alix de Luxemburgo (*1929), duas vezes bisneta de D. Miguel I. Imagine-se o quanto esses casamentos não aportaram de paz às almas dos que, em vida, eram chamados de “irmãos em desatino”.[24]


A descendência de D. Miguel foi motivo da obra que o grande historiador português Caetano Maria de Abreu Beirão (*1892 †1968) intentou em 1943 e que consta da bibliografia. Rico trabalho de pesquisa e pleno de registros históricos importantíssimos para a análise dos sucessos e das desventuras do ramo miguelista da Casa de Bragança.

Já a posteridade de D. Pedro é mais complexa. Ela se constitui de três tipos: legítima, legitimada e ilegítima[25]. Isso dificulta, em muito, o trabalho dos historiadores e genealogistas que a queiram investigar. De forma resumida, dei conta dela na seção da História Genealógica recentemente publicada em Portugal. O Abade emérito de São Bento do Rio de Janeiro, D. José Palmeiro Mendes OSB, e o atual presidente do Colégio Brasileiro de Genealogia (CBG), Carlos Eduardo Barata, estão entre os pesquisadores que já adiantaram bastante os dados de atualização dessa árvore de descendência.

Para findar este artigo, resta dizer que, por motivo do Bicentenário, o Instituto Cultural D. Isabel I a Redentora (IDII) projetificou o Portal da Corte Brasileira na Internet (www.cortebr.com.br), que visa disponibilizar de forma ampla e democrática as informações concernentes aos grandes fatos e personagens do Brasil joanino e do I, II e III Reinados brasileiros, além de todos os dados sobre os príncipes referidos aqui.[26]


[1] Bruno da Silva Antunes de Cerqueira (*1979) é historiador e pós-graduando em Relações Internacionais pela Univ. Cândido Mendes.
[2] Cf. SOUSA, D. Antonio Caetano de. História Genealógica da Casa Real Portuguesa. (QuidNovi e Academia Portuguesa da História, Lisboa, 2008). A primeira edição foi impressa entre os anos de 1735 e 1749.
[3] SCHWARCZ, Lilia Moritz. As Barbas do Imperador: D. Pedro II, um monarca nos trópicos. Companhia das Letras, São Paulo, 1998.
[4] Cf. Revista de História da Biblioteca Nacional. Assim é se lhe parece. Entrevista com Lilia Schwarcz. Ano 3. Número 34. Rio de Janeiro, Julho 2008.
[5] Cf. EDMUNDO, Luiz (Luiz Edmundo de Melo Pereira da Costa). A Corte de D. João VI no Rio de Janeiro. 3 vols. Rio de Janeiro, 1940.
[6] Cf. OLIVEIRA LIMA, Manuel de. D. João VI no Brasil. 4ª. edição, Topbooks, Rio de Janeiro, 2006. A primeira edição, como é sabido, deu-se no Centenário da Corte (1908).
[7] Em artigo no Diário de Pernambuco (23.09.1926), Gilberto Freyre se referia a D. Pedro Henrique (*1909 †1981), Chefe da Casa Imperial que aniversariava em 13 de setembro, como o “Messias real” do Brasil e dizia claramente que era uma superioridade nossa, em relação aos nossos vizinhos de “aventura republicana”, termos às nossas ordens uma realeza nacional.
[8] Cf. PERRY VIDAL, Frederico Gavazzo. Descendencia de S. M. El-Rei o Senhor Dom João VI (28º Rei de Portugal). Guimarães e Cia. Editôres. Lisboa, 1923.
[9] ZUQUETTE, Affonso E. M. et alii: Nobreza de Portugal e do Brasil, 3 vols. Editorial Enciclopédia, Lisboa, 1961.
[10] Sobretudo levada a cabo pela Profª. Dra. Francisca Nogueira de Azevedo (UFRJ), a quem todas as homenagens devem ser rendidas. Ver Bibliografia.
[11] Nascida princesa Sophie Friederike Auguste de Anhalt-Zerbst, pequena dinastia fortemente luterana da órbita da Casa Real prussiana.
[12] A endogamia das dinastias é outro motivo para controvérsias, postulações ignaras e galhofas. No texto sobre a descendência de D. Pedro I acima citado, digo a respeito: Alguns autores defendem que essa endogamia prejudicou as dinastias católicas, uma vez que a Igreja a consentia com medo de casamentos com Casas protestantes ou ortodoxas. Recentemente, Chantal de Badts chega a ironizar no Petit Gotha[12] que a “Igreja preferia acordar dispensas de casamentos várias vezes consangüíneos, que ela interditava ao comum dos mortais. Curiosa maneira de proteger as dinastias católicas”.
Não é esse o nosso pensamento. Ainda está por se fazer um estudo acurado sobre a endogamia das linhagens soberanas e principescas européias, mas é certo que, conforme esclarecem diversos antropólogos do século XX, entrelaçamentos praticados no mesmo etnos durante séculos não podem provocar anomalias físicas ou mentais, per se. Contudo, também parece óbvio que determinadas doenças com propensões predominantemente genéticas se mantivessem em algumas Casas (hemofilia, epilepsia etc.). Cf. CERQUEIRA, Bruno da S.A. de. Descendência de D. Pedro IV, Rei de Portugal e I Imperador do Brasil, in História Genealógica da Casa Real Portuguesa. vol. XV (QuidNovi e Academia Portuguesa da História, Lisboa, 2008), pp. 255-256.
[13] O termo está empregado aqui tanto no sentido religioso, quanto no político, dada a união Igreja-Estado. É amplamente sabido que os matrimônios principescos eram corolários da Razão de Estado.
[14] Reza a lenda que um mendigo teria esmolado a D. João IV (*1604 †1656) e este o teria repelido. A praga do mendigo, de que todos os varões primogênitos dos Bragança pereceriam, teve longa duração, pois nenhum primeiro filho nascido na dinastia real portuguesa e, depois, imperial brasileira, vingou além da primeira infância...
[15] Cf. ZUQUETTE, Affonso E. M. et alii: D. João VI e a sua Descendência in Nobreza de Portugal e do Brasil, vol. I, Editorial Enciclopédia, Lisboa, 1961 (p. 716).
[16] D. Pedro José Joaquim Vito de Meneses Coutinho (*Lisboa, c. 1775 †Paris, 22.11.1823), 6º Marquês de Marialva, 8º Conde de Cantanhede etc. Filho do 5º Marquês de Marialva e de D. Margarida Caetana de Lorena Álvares Pereira de Mello (Cadaval). Cadete no regimento de Alcântara aos 11 anos, seguiu depois vários postos na hierarquia militar portuguesa até atingir o posto de brigadeiro em 1807, ano em que entrou para a diplomacia. Pertenceu à delegação enviada pelo Regente D. João para cumprimentar Napoléon, sendo bastante repelido. Em 1814, com a restauração bourbônica em França, foi encarregado de representar Portugal junto a Louis XVIII. Por fim, atuou como o grande ministro português junto a Viena no processo matrimonial do Príncipe Real D. Pedro com a Arquiduquesa Leopoldine. Morreu sem aliança, legando o marquesado de Marialva e suas possessões à Casa Ducal de Lafões, uma vez que sua irmã era a mulher do 2º Duque de Lafões, D. João Carlos de Bragança Sousa Ligne Tavares Mascarenhas da Silva (*1719 †1806). O Marquês de Marialva deixou descendência ilegítima, a qual passou ao Brasil, sendo um seu neto Seraphim José de Meneses (†1867), titulado Barão de Araçuaí por D. Pedro II a 14.03.1855.
[17] Seu pai, o Grão-Duque Jean I (*1921), é bisneto duas vezes, pois filho do casal de primos-irmãos Charlotte I de Luxemburgo (*1896 †1985) e Felix de Parma (*1893 †1970). Ao desposar a prima Joséphine-Charlotte da Bélgica (*1927 †2005), irmã de Baudouin I e Albert II dos Belgas e filha de Leopold III (*1901 †1983) — filho de Elisabeth (*1876 †1965), rainha belga que visitou com o marido, Albert I (*1875 †1934), o Brasil, em 1920. A Rainha Elisabeth, nascida duquesa em Baviera, era filha de D. Maria José de Portugal (*1857 †1943) e neta de D. Miguel. Como prova inconteste da falta de conhecimento dos brasileiros sobre a temática aqui tratada, leia-se na supramencionada Revista de História da Biblioteca Nacional o artigo Bom mesmo é banho de mar, do historiador Paulo Francisco Donadio Baptista, onde se relatam os detalhes da visita de Albert e Elisabeth. O texto é muito bom, mas em nenhum momento o autor expõe que a rainha era bisneta de D. João VI... Cf. RHBN. Ano 3. Número 34. Rio de Janeiro, Julho 2008 (pp. 79-83).
[18] O Duque Adolf havia sido destronado de Nassau em 1866 pelas tropas prussianas. Contudo, pelo Pacto de Família (1783) entre os ramos da Casa de Nassau (Orange-Nassau, Nassau-Weilburg etc.), ele seria o sucessor do Rei dos Países Baixos como Grão-Duque de Luxemburgo, na hipótese de morte sem sucessão masculina. Isto ocorreu em 23 de novembro de 1890, quando Willem III dos Países Baixos (*1817 †1890) faleceu e foi sucedido por Wilhelmina I (*1880 †1962), avó da atual Rainha neerlandesa. Desde então, o Luxemburgo é um estado soberano.
[19] D. Adelaide nasceu em 3 de abril de 1831, no Castelo de Kleinheubach (Baviera), como princesa Adelheid Sophie Amelie Luise Johanna Leopoldine de Löwenstein-Wertheim-Rosenberg, filha do Príncipe hereditário Constantin de Löwenstein-Wertheim-Rosenberg (*1802 †1838) e da Princesa hereditária, nascida princesa Maria Agnes Henriette de Hohenlohe-Langemburgo (*1804 †1835). Seu casamento com D. Miguel foi autorizado pelo irmão, Karl (*1834 †1921), Príncipe titular de Löwenstein-Wertheim-Rosenberg, e se realizou no Castelo de Kleinheubach em 24 de setembro de 1851. A Casa de Löwenstein-Wertheim é um ramo morganático da dinastia Wittelsbach, nascido em 1470, pelo casamento do Eleitor Friedrich I do Palatinado Renano (*1425 †1476) com Klara Tott. O filho do casal, Ludwig (*1463 †1524), foi titulado Conde de Löwenstein ao nascer. Sua descendência se dividiu, no século XVIII, nas Casas de Löwenstein-Wertheim-Freudenberg (luterana) e Löwenstein-Wertheim-Rosenberg (católica). O ramo primogênito (Freudenberg) somente adquiriu condição principesca em 1812; já o secundogênito era Príncipe do Sacro Império Romano-Germânico desde o início do Setecentos. A Rainha D. Adelaide terminou a vida no Convento de Santa Cecília, em Cowes, Ilha de Wight (Inglaterra), onde havia sido consagrada como Sóror Adelaide.
[20] A expressão é esta mesma: grão-duque hereditário. Significa, obviamente, herdeiro do trono, mas se trata de filigrana na versão do título germânico que inclui a partícula Erb no início, diferenciando-se do Kron. Erbgrossherzog e Erbprinz, distintos de Kronprinz.
[22] Trineto de D. Pedro I, pois filho de Friedrich August III (*1865 †1932), último monarca reinante da Saxônia, filho, por sua vez, de Geörg I (*1832 †1904) e da Infanta D. Maria Anna (*1843 †1884), quarta filha de D. Maria II.
[23] Karl Franz Josef Ludwig Hubert Georg Otto Maria von Habsburg-Lothringen, Arquiduque e Príncipe Imperial da Áustria, Príncipe Real da Hungria e da Bohêmia, Príncipe Ducal de Lorena e de Bar, Príncipe de Habsburgo-Lorena, nasceu em 17 de agosto de 1887, no pequeno Castelo de Persenbeug. Era o filho mais velho do Arquiduque Otto (*1865 †1906) e da Arquiduquesa Maria Josepha (*1867 †1944), nascida Princesa da Saxônia. Maria Josepha era filha de Georg I da Saxônia etc., e da Rainha, nascida Infanta D. Maria Anna de Portugal, já citados. O pai de Karl era irmão e herdeiro dinástico do Arquiduque herdeiro Franz Ferdinand (*1863 †1914), cujo assassinato em Sarajevo provocou a guerra da Áustria com a Sérvia e deu início à I Guerra Mundial. Franz Ferdinand era o herdeiro imediato do velho Imperador Franz Josef I (*1830 †1916) — marido da Imperatriz Elisabeth, a Sissi —, cujo reinado se estendeu de 1848 até 1916 e que perdera o filho, Arquiduque herdeiro Rudolf (*1859 †1889), na tragédia familiar conhecida como Mayerling, lugarejo em que se suicidaram Rudolf e sua amante, a baronesa Maria Vetsera.(*1871 †1889).
KARL tornou-se herdeiro imediato do tio-avô em junho de 1914; desde outubro de 1911 ele era casado com a prima Zita de Bourbon (*1892 †1989), princesa de Parma etc., que lhe deu oito filhos, o mais velho dos quais, Otto (*1912), acaba de completar 95 anos e receber uma gloriosa Missa de Ação de Graças na Catedral de Viena. O Bem-Aventurado Carlos faleceu precisamente em território português, na cidade de Funchal (Madeira), no 1º de abril de 1922, com os mesmos 35 anos de idade em que falecera seu trisavô D. Pedro I e IV. Está enterrado lá até hoje.

[24] Cf. CERQUEIRA. Op. cit. P. 236.
[25] Idem. P. 233.
[26] O produto de divulgação do portal da Corte é precisamente a Genealogia Resumida da Realeza Brasileira, que mostra a descendência de D. João VI até o início do século XX.